O Camaleão
Dissimulo-me socialmente para passar despercebido e encobrir meus reais objetivos. Se você curte Rock, viro um roqueiro das antigas, se é de pagode, então, tenho samba no pé. É de sertanejo que você gosta? Chego logo de chapéu, fivelão e bota de caubói. Sou daqueles que viram seu melhor amigo em quarenta e cinco minutos, no tempo em que dividimos uma cerveja no bar da esquina. Assim vou vivendo, me apropriando da personalidade de cada indivíduo que eu convivo. Sou um receptáculo vazio, e me preencho de características alheias para compor o meu caráter. No entanto, não sou ninguém, não tenho caráter e queria mesmo era ser como você. Tudo de bom que você tem, eu uso em meu benefício, as coisas ruins eu uso contra você mesmo. Sou uma espécie de diabinho, igual àqueles que aparecem quando a consciência está em conflito. Contudo, também posso ser o anjinho, se isso me convier. Sempre apareço naquela farra, e desapareço nas horas ruins. Sempre estou ali para te lembrar de como deu errado daquela vez que você tentou: ”Lembra, não deu certo, acho melhor...”. E sorrio, por suas costas, quando consigo convencê-lo de que você não é capaz. E, se por um acaso, você insistir e continuar tentando e continuar crescendo e continuar aparecendo... “Mais do que eu?” “Que ousadia?” “Quem ele pensa que é?” me vejo dizendo, babando de raiva e destilando meu veneno. Aí, não tem jeito, tenho que usar aquilo que sei de você, aquelas coisas que você me disse num dia de euforia, ou de tristeza, me chamando de brother, de camarada, e batendo em minhas costas, e dizendo: “Tu és meu amigo”. Veja que piada, que inocência. Como quem não quer nada me escapulirá algum erro que você tenha cometido, ou deturparei algum fato ocorrido, ou mesmo, inventarei coisas absurdas a seu respeito, sem nenhum pudor, sem pestanejar, sem pensar duas vezes. Faço isso por que te admiro e te odeio, com a mesma intensidade. Eu, seu amigo? Faça-me o favor. Não sou amigo de ninguém, sou amigo de mim mesmo, e uso o que sei de você, que me acha seu amigo, para tirar proveito próprio ou para te difamar. Claro que trabalho em silêncio para lhe atingir, ajo sem alarde. Quando você se der mal, nada respingará em mim, ninguém me ligará ao seu fracasso, ao seu insucesso. Tudo parecerá, simplesmente, incompetência, sua incompetência; nada mais que isso. Eu sou o camaleão e mudo de cor a depender do ambiente em que estou. Adapto-me rapidamente, e espero a hora certa para atacar. Para te atacar. Esse é meu real objetivo. Agora que já estou terminando, vou te contar um segredo. Na verdade eu sou a Inveja, só me camuflei de camaleão para ficar próximo de você, bem pertinho, do seu lado, sem que você perceba que está sendo ameaçado.