MARGARIDA
MARGARIDA
I
Feliz no casamento ela não foi. Após o nascimento de Amanda, seu segundo parto, que veio fazer companhia a Geraldo, o marido desapareceu para lugar incerto e não sabido. Nunca mais deu sinal de vida. Era de se esperar, pois, antes, nunca dera ele a mínima atenção à família. Vivia desempregado, sempre nos bares com os amigos, e para Margarida e os filhos, jamais ligava. A mulher teve que se desdobrar para sustentar as crianças. E não era fácil. Trabalhava de diarista em algumas casas de família, e ainda preenchendo as horas vagas, lavava e passava roupas em outras.
O tempo e as dificuldades continuavam. No supermercado só podia comprar o que comer naquele dia.
Na cidade onde Margarida morava, em Goiânia, foi construído um presídio de segurança máxima, sendo para lá transferido grande número de criminosos condenados, todos de alta periculosidade.
Numa das casas em que Margarida prestava serviço, morava o diretor do presídio. Uma família bem constituída, onde imperava o clima de verdadeiro lar, sendo Dona Alzira, a mulher da casa. Logo ela se afeiçoou à ajudante, passando a tratá-la como verdadeira pessoa da família. Principalmente, por conhecer a situação de penúria em que Margarida vivia.
Na prisão, o Dr. Miguel era muito querido. Sua formação religiosa, desde a mais tenra idade, levou-o a ser um homem bondoso, longe de cometer atos que não fossem justos. Sempre procurava, da melhor forma, tornar o presídio o mais humano possível, mantendo um tratamento muito diferente dos que se vê por aí. Era muito querido, tanto pelo corpo de segurança e funcionários da cadeia, como pelos presos. Para todas as finalidades era procurado. Problema de ordem familiar dos seus comandados, seja em questão financeira, seja de relacionamento conjugal, de educação dos filhos. E, até mesmo entre os presos, Dr. Miguel tornou-se um verdadeiro pai sempre procurando tornar o local o mais pacífico possível, evitando acontecimentos que viessem provocar distúrbios de consequências desastrosas.
Diante disso, volta-e-meia o Dr. Miguel levava para sua casa, não muito distante do presídio, um ou outro preso a fim de executar certos serviços de manutenção da sua moradia. Claro, que após conhecer mais profundamente o detento, e, também, tomar certas precauções que eram necessárias, principalmente, na vigilância do mesmo.
II
Elesbão era um sujeito pacato. Morava no interior de Minas Gerais, numa pequena cidade onde a atividade principal, a pecuária, constituía-se o ganha-pão de seus moradores. Trabalhava na manutenção da fábrica de laticínios, fazendo todo e qualquer serviço relacionado ao funcionamento da empresa, na parte elétrica, hidráulica, e outras. Casado com a filha única de uma viúva, cujo marido lhe deixara enorme fortuna em dinheiro, além de diversas fazendas com um sem número de cabeça de gado. Mas, avarenta como só! Tinha como ideia fixa, de que Elesbão havia se casado com a filha, somente pela sua riqueza. Daí, o relacionamento entre ela e o genro sempre foi tumultuado. Morando na mesma casa, as brigas eram constantes. Angélica, a mulher de Elesbão, apaixonada pelo marido, dia a dia foi criando verdadeiro ódio da mãe. Certa ocasião chegou a comentar com Elesbão:
- Tenho até vontade de matar minha mãe!
Essa frase passou a frequentar os pensamentos de Elesbão. Sempre que acontecia uma briga com a sogra, ele lembrava-se do que Angélica falara. Não aguentou mais! Após o último entrevero desabafou:
- Angélica, das duas uma, ou mato sua mãe, ou acabo com nosso casamento! Você nunca mais irá me ver!
À noite, na cama, Angélica declara:
- Elesbão, não tenho coragem! Por favor, não me abandone!
Então, no desespero, não mais suportando aquela situação, resolveu ele não só acabar com a vida da sogra, como a de Angélica! Do modo mais cruel possível!
Foragido durante algum tempo, acabou preso, julgado e condenado à pena maior, a ser cumprida em prisão de segurança máxima, dada a crueldade com que eliminou a mulher e a sogra. Tornara-se um criminoso de alta periculosidade. Foi para o presídio de Goiânia!
Dr. Miguel sempre necessitava de algum serviço em sua casa. Ora um azulejo do banheiro que se soltara, ora vazamento na válvula Hydra, ora um conserto na rede elétrica. Sabia das habilidades de Elesbão, pois, este se tornara o faz-de-tudo na prisão, e não titubeava em levá-lo à sua residência, para executar os serviços necessários. Na realidade, Elesbão era dotado de bons sentimentos. Jamais tornaria a cometer loucuras.
III
Numa das ocasiões, o detento conheceu Margarida. Os dois se olharam, e algo estranho se apossou de ambos. Era um sentimento mais forte, muito além de um simples encontro.
Então começou um namoro, que foi muito alimentado por Dona Alzira, que tudo fazia para ver Margarida feliz. Quando não havia motivo para se encontrarem na casa do Dr. Miguel, a moça conseguia a permissão de visitar Elesbão no presídio. Os filhos de Margarida, nunca tendo a oportunidade de conviver com um pai, receberam o namorado da mãe com o maior carinho e felicidade.
O casamento não durou muito para acontecer! A cerimônia foi na capela do presídio, tudo muito simples, como a própria situação recomendava.
Nada mudou na vida de ambos, pois, ele tinha de cumprir a pena, e ela continuar em sua atividade para se manter e criar os filhos. Passou a trabalhar somente na casa do Dr. Miguel, com salário fixo e outras vantagens.
Elesbão, por seu comportamento exemplar no cativeiro, teve sua pena bem reduzida. Em pouco tempo, viu-se livre da cadeia.
Mas, o melhor estava por vir. Durante o julgamento, jamais houve qualquer referência quanto ao motivo do crime ter sido ele ficar com os bens da sogra.
Assim, pode, através dos meios necessários, requerer judicialmente a herança, demonstrando ser o único herdeiro com direito a recebê-la.
Se obteve êxito? Até hoje não se sabe!