Márcio , o escrevinhador

Butch Mitchell acertou Arizona Colt entre os olhos . Ele tombou para a direita e caiu cara a cara com o deserto.Ponto final .Uma da matina . Mais tarde , dou uma avançada no Capitão Seven .O adiantamento já acabou . Minha cabeça parece um ringue vazio , sem idéia e sem pique para nada .Já ia esquecendo dos livros para as boyzinhas, “literatura adolescente”, que nem sei a quantas anda : sem registro , igual ao robô do Space Lost ,segundo a contabilidade .

Talvez eu não deva matar Arizona Colt nem tão cedo, o cara vende bem e todo mundo gosta do vilão , da alma sebosa .E eu preciso comer . Carminha já ameaçou me botar em cana , se atraso a pensão dos garotos . Essa mulher pensa que escrever é fácil , feito vender roupa de camelô , camisa chinesa e tudo o mais . Qual nada . È um quebra cabeça dos diabos .

O editor me espinafrando via telefone , feito gigolô :

- Márcio , meu filho, escreva mais rápido, tá ? Até quando acerta você erra,porra!

Às vezes, fico engulhando de raiva .Depois, bate uma tristeza lenta, feito uma torneira pingando.Existe uma arte prostituta ? Sim,estamos aí. Uma cochilada e o telefone me joga no mundo dos vivos : o cara da gráfica . Pedindo ara agilizar junto ao Beltrão,o pagamento da segunda parcela do Capitão Seven , Agilizar ? Não sei como é em inglês, mas no meu português deste ano,é erguer-se da cadeira puxando pelos próprios cabelos .

Surpreendo a mim mesmo . Peço um tempo , retorno a ligação , prometo o que não depende de mim e clic . Capitão Seven ataca dois ETs...que merda , como seria os ETs ? Lembro dum seriado bem antigo da TV , quando apenas a rigidez num dedo das mãos distinguia os invasores das demais pessoas .Qual dos dedos?Sei lá! Coloco ou não ?Dou um tempo, olho ao meu redor: um televisor velho, uma geladeira em petição de miséria, uma bandeira do Vascão na parede, uma cama ameaçada por uma estante meio desconjuntada : os salvados de nossas tempestades conjugais .Tudo uma amargura só .

Escrever é uma sina é um pecado é um karma ao contrário . O editor dá - me um soco no peito e cuspo um western , um conto policial , um livro pra adolescente punhetar . Grudada na tela do computador, uma foto da Elaine , tão mal definida quanto o nosso caso , um pega – larga , já dois anos . Levanto da cadeira, abro os armários , olho meus velhos exemplares de Capitão Sete , Águia Negra, Cavaleiro Fantasma ,Cavaleiro Negro, Durango Kid , tudo da época da Rio Gráfica e da Ebal . Tudo serve de motivação para quem é um capitulo sem livro de Marcial Lafuente Estefânia , Corin Tellado, El Sov , plágio descarado de mim mesmo .O eterno retorno em sua expressão mais chula , as pessoas comprando ávidas para colorir suas vidas , cafungar a coca em letra de forma que ofereço , meu crack de papel , vendido na banca da esquina . Vale tudo, pegar uns parágrafos ,fazer uma página atrás da outra e soltar. Todos gostam no final : os enganadores e os enganados. Ligo o computador e recomeço a digitar .O sono ainda não esqueceu de mim. Vou ler um Buck Jones e tentar tudo de novo, de novo.

andre albuquerque
Enviado por andre albuquerque em 10/03/2013
Código do texto: T4181971
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