As Marquizes de Copa e seus personagens:
AS MARQUIZES DE COPA E SEUS PERSONAGENS:
NEGRO ZULU.
Ele aparecera ali nas redondezas da Prado Júnior lá por volta do final da década de setenta inicio de oitenta, não recordo bem; negro retinto, forte, na realidade imenso, devia medir um e noventa ou dois metros, impressionava e impunha respeito não só pela aparência física mais principalmente pela majestosa elegância que transparecia em seus gestos e atitudes.
Circulava a boca pequena, que ele havia lutado na guerra de libertação de Angola e esse fato ainda dava-lhe uma aura maior de mistério e despertava certo medo em alguns moradores das redondezas.
Mas como tudo na vida, o tempo se encarrega de transformar, assim se deu com Zulu, o nosso majestoso pseud. Angolano em questão.
Homem de poucas palavras, mas sempre solicito com todos, em especial com os idosos, com os pivetes, sempre disposto a ajudar no que fosse preciso. Com o passar do tempo ele foi conquistando a confiança dos comerciantes da região e passou a fazer pequenos serviços ao qual era solicitado, e assim conseguia os parcos recursos para se alimentar e foi tocando sua vida, só nunca aceitou moradia mesmo tendo varias vezes sido oferecida para que saísse da rua mais precisamente de baixo das marquises nas quais se abrigava nos dias de chuva e frio.
Copacabana é cheia de histórias ricas em dimensão, tanto trágicas, cômicas, surreais, surpreendentes e principalmente humanas.
Em seu universo miscigenado, onde todas as etnias, classes sociais dá-lhe um toque universalista em suas relações não perde seu provincianismo mesmo fazendo parte de uma grande metrópole com todos seus problemas sociais e estruturais.
Negro Zulu integrou-se neste mundo de forma definitiva como personagem do cotidiano, o tempo passava a rotina daquela vida misteriosa seguia seu curso sem grandes atropelos; até aquele momento fatídico onde tudo acontecera de forma rápida e cruel.
Era uma quinta- feira, como tantas outras, o burburinho da feira na Belford Roxo começava já de madrugada com as montagens das bancas de peixe; ou melhor, dizendo com as chegadas dos caminhões adaptados para o comércio de pescados que se posicionavam em fila formando varias bancas lado a lado donde partiam os gritos estridentes dos vendedores a apregoar sua mercadoria. Naquela Babel de sotaques dos mais variados todos tentavam vender seus peixes literalmente e tantas outras mercadorias desde frutas, verduras, legumes e também quinquilharias que os camelos ofereciam aos eventuais compradores.
Como era comum naquele aparente caos comercial, tinha sempre os malandros e oportunistas que se infiltravam entre os feirantes para fazerem seus roubos, principalmente os punguistas que costumavam se utilizar dos pivetes para criarem tumultos entre os fregueses e assim puderem agir sem despertar suspeitas dos raros policiais que davam segurança a feira.
Negro zulu, naquele dia de feira era sempre o mais solicitado entre os feirantes para fazer pequenos trabalhos, pois era talvez de todos os moradores de rua daquela região de Copacabana o que adquirira a confiança de todos que o conheciam.
Quando o grito de pega! Pega! Começou todos os que se encontravam entorno do acontecido trataram de se proteger como dera, uns entrando nos bares das redondezas outros entrando nos prédios vizinhos etc.; era comum estes tumultos, hora era um pivete que roubava uma bolsa de alguma madame distraída outras vezes uma tentativa de prisão efetuada por policiais que descobriam entre os frequentadores algum fugitivo ou malandro conhecido que devido ao grande movimento do lugar aproveitava para circular sem ser facilmente percebido. Mas naquele dia era diferente o motivo dos gritos de pega! Pega! Era por causa de um garoto mirrado que vinha em desabalada carreira com um trezoitão nas mãos e atrás dele quatro ou cinco policias com as armas também nas mãos e no meio da multidão o moleque para se volta e começa a atirar contra os policias que se protegem como podem.
Ai tudo acontece; nego Zulu na sua calma de sempre com seu caminhar compassado como a desfilar numa passarela de samba surge no meio do tumulto desavisadamente carregando uma caixa repleta de maças que algum feirante houvera de encarrega-lo de alguma entrega.
Aquele negro imenso desaba que nem um passarinho no asfalto úmido e sujo e logo a sua volta uma enorme poça vermelha se forma como se uma cascata de sangue saísse daquele coração agora transpassado pela bala assassina e certeira que o atingira. A seu lado o corpo quase esquálido de um menino loiro aparentando uns quinze ou dezesseis s anos jazia também ensanguentado após ter sido atingido por vários tiros dos perseguidores, seus sangue misturavam-se numa estranha falseta do destino que naquele momento unia dois destinos totalmente diversos na mesma tragédia do cotidiano daquela Copacabana cantada em versos por tantos poetas, ao mesmo tempo tão aconchegante e familiar e tão trágica em suas histórias humanas.