Por acaso

Naquela manhã eu acordei bem disposta, um pouco sonolenta por ter ido dormir quase amanhecendo, talvez a conversa do dia anterior tivesse me fornecido uma esperança fora do comum. Lavei meu rosto, passei alguns cremes e umas pinturas e me senti confiante o bastante para enfrentar o raiar do dia, que caminhava lentamente sobre as nuvens, deixando o dia com um aspecto nublado e um tanto bucólico.

Como uma estátua eu me posicionei no ponto de ônibus e dessa forma permaneci. Afim de evitar maiores cerimônias, olhava com frequência as horas no meu celular que estava sem serviço, contando os segundos na minha cabeça que contava diferente do relógio.

O meu ônibus apontou na esquina, com um ranger ensurdecedor de motor e tudo que parecia combinado, se tornou por um acaso, uma mera coincidência. De novo me senti como uma vítima, em um labirinto conhecido, mas pouco visitado. Perdida em meus pensamentos, estava rodeada por um matagal que exalava o odor de corpos em decomposição, e pela companhia de homens de meia estatura que me encaravam com olhares intimidadores.

Nesse meio tempo, enruguei a testa num gesto involuntário e me esforcei para manter a expressão tranquila diante dos desconhecidos, estava atormentada mentalmente e era possível perceber através da encenação. Ao entrar no coletivo, me deparo com a mesma cena que se repete diariamente, como em um disco riscado. Pessoas se equilibram entre os espaços e os vendedores ambulantes, que dependem do movimento para sobreviver. Como um vulto, deslizo para o fundo do ônibus, tateio os bolsos à procura do fone de ouvido, desembolo os fios emaranhados, os conecto à minha subjetividade e desapareço feito fumaça.

Laísrosa
Enviado por Laísrosa em 02/02/2013
Reeditado em 15/08/2017
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