Muladeiro (capítulo XV)
____ Nem pense numa desgraceira dessa, meu irmão! Cê enlouqueceu de vez? - disse Israel quando soube do ocorrido e da vontade de vingança, que cegava Minduim.
Sem conseguir pensar em quase nada, exceto no semblante velado do pedido de socorro de Jacira, Minduim saiu à noitinha, após todo o serviço feito, sem dizer o que faria e para onde iria; antes, porém, pegou duas lamparinas da cozinha, porque sabia que voltaria pela escuridão, e as luas minguantes, daquela semana, não tinham claridade suficiente para iluminar o caminho.
Teodoro sentiu a ausência de Minduim na hora do jantar, porém nada comentou, e Israel, alegando estar sem fome, apenas fez companhia ao patrão, que dava largas garfadas no cozido de carne com legumes.
Antonio estranhou a atitude de Israel, porque sabia que o peão era bom de garfo, sem contar que nunca recusava o cozido da Jacira. Ele sempre esperava todos comerem para avançar na caçarola e, ali mesmo, regalava-se até secar o último caldinho da carne com miolo de pão.
O viúvo sempre sentava-se de costas para a porta da cozinha que, durante as refeições, ficava aberta, e naquela noite não foi diferente.
Feito gato andando no assoalho, inesperadamente o pai de Ernestina surge na porta da cozinha com um cutelo na mão direita, e num golpe certeiro e veloz atinge Teodoro na cabeça, que caiu com a face dentro do prato de comida.
____ Acudam! Acudam meu pai!- gritava Antonio, aterrorizado com a cena.
Israel saltou da cadeira, tirou a criança do local, levou-a para o quarto dando-lhe ordens rígidas para que não arredasse os pés daquele lugar, enquanto ele iria buscar ajuda. Atônito e em estado de choque, tudo o que o pequeno Muladeiro fez foi esconder-se sob a cama, sem que qualquer pessoa suspeitasse de que naquele cômodo haveria alguém.