PRETINHO

PRETINHO.Era assim que chamava aquele garoto negro. Era magrinho,quando eu o conheci,tinha oito anos de idade, morava em um cômodo na favela do Surano. Sempre que eu passava em frente à sua casa,lá estava ele, com as pernas cinzentas,jogando bolinha de gude,junto a seus amigos. Parei uma vez para contemplar a brincadeira e percebi que ele era muito esperto,e os outros meninos ficavam esperando uma ordem dele, que falava: - Joga.Agora é a "sua" vez. Sua mãe,como muitas mulheres brasileiras,era solteira,tinha três filhos,e Pretinho era o filho do meio.Eu só a conhecia por ouvir falar. Num domingo de sol,fui comprar pão,pela manhã.Na padaria, a conheci pessoalmente (a mãe de Pretinho).Quando olhei em sua face, vi uma senhora,que além de senhora,era uma senhora guerreira,que já lutou muito na vida. Ela estava na fila para comprar pão.Enquanto ela esperava sua vez, percebi que ela não tirava os olhos da televisão do local,pois mesmo em uma manhã de domingo,,já se ouvia notícias de uma criança que foi atingida por balas perdidas.Esse é o café da manhã de um periférico brasileiro. Todos ali prestavam atenção,e comentavamsobre o assunto.Eu, então perguntei: - A senhora é mesmo a mãe do Pretinho,não é? - Sou sim.Por que? -perguntou a mulher. - É porquê eu tenho uns livros infantis,e pensei que o Pretinho gos- taria se eu emprestsse-os para ele.Ele gosta de ler? Ela riu de mim,e disse: - Ler?Meu filho não está nem na escola. Eu apontei o dedo para a televisão e disse: - O tiro que foi disparado pode ter vindo de uma pessoa que tem a mãe que pensou assim,como a senhora,em deixar seu filho fora da escola. Ela virou as costas depois de pegar o pão,e saiu.Cada um foi para sua casa, e eu fui para a minha. Eu acredito que ela deve ter ficado pensativa com aquilo que eu disse. Três semanas depois,fiquei sabendo que Pretinho começou a estudar,e fiquei muito feliz.No sábado encontrei ele no campinho jogando bola com seus amigos.Cheguei, e ofereci um livro do autor Sacolinha.Ele me disse: - Valeu!Eu ainda não sei ler,mas,garanto que quando aprender, vou ler tudinho.Valeu mesmo! - Mas é pra ler mesmo,hein? - Pode deixar,"tio". Uns quinze dias depois,ele veio me devolver o livro.Eu disse: - Já leu? - Pode crer tio,sabe como é,né?Mas você tem mais livros aí? - Faz assim:pede pra sua mãe te deixar uns minutos aqui pra eu te mostrar uns livros da hora, beleza? Ele foi entusiasmado,e uns dez minutos depois,voltou. Eu mostrei um monte de livros legais para ele. Hoj,alguns anos depois,o Pretinho cresceu,estudou,se formou,e...Ha!Ninguem mais chama ele de Pretinho.Sabe por que?Porque hoje,ele é uma altoridade... Um JUIZ da VARA DA INFÂNCIA JUVENIL. ESCRITO POR:Uolly

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Uolly
Enviado por Uolly em 28/12/2012
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