Quando a Morte vem ou A hora da Morte
Ele nunca havia agido daquele jeito, mas nos últimos meses estava muito estranho. sempre que falava com alguém se despedia com um saudosismo atípico, como se aquele "tchau" fosse o último. Além do mais não se sentia atraído para sair para canto nenhum. Não queria sair de casa e estava decidido! Não queria saber de festas, cinema, barzinhos no final de semana. ele parecia ter medo de tudo ao seu redor. Passou a desenvolver uma espécie de fobia sem causa aparente. Instruído por alguns amigos de trabalho e de bar, ele decidiu procurar um analista. Visitou algumas páginas na internet e se interessou por um anuncio em letras garrafais e chamativo: A CURA PARA SEUS MALES MENTAIS! DR. IVOCO EQUÍ. Antes de ir até o analista, decidiu aprofundar seu conhecimento sobre o mal que o acometia. Quem sabe não estivesse com síndrome do pânico, ou até quem sabe TOC, o célebre transtorno obsessivo compulsivo! Ou mais ainda... Quem sabe um súbito acesso de stress em alta concentração? Eram tantas doenças atraentes que poderiam estar tomando conta de seu "eu" que ele nem sabia como se rotular.
Na tarde seguinte lá estava ele na sala do tal doutor Ivoco Equí. Durante a consulta, ao em vez da cura ele conseguiu ficar ainda mais nervoso pois estava claro que ele estava sofrendo de um tipo de sociofobia de tipo agudo! quem já ouviu falar disso, mas como ele já nem sabia quem era o que dirá questionar o Doutor que parecia mais perturbado do que o paciente. As causas das perturbações variavam de motivos pessoais, amorosos e sem dúvidas e inesquecivelmente os problemas financeiros.
Com um ar resoluto, o apático doutor receitou algo que seria óbvio e que nem precisaria de uma consulta tão cara para seguir: Sossego! Pediu-lhe que fizesse caminhadas matinais, passeios pela orla, idas ao cinema... Algo que o fizesse alegre e tranquilo.
Na primeira manhã saiu bem cedinho para uma caminhada. O clima agradável logo foi maculado pela presença de dois ébrios que acabavam de cair ao chão de tão alcoolizados que estavam.
Eram moradores de rua... As famosas pessoas invisíveis aos nossos olhos tão capitalistas! Voltou para casa com a pressão altíssima. Pela tarde quem sabe com um passeio pela orla ele melhoraria? Melhoraria se não tivesse sido assaltado por dois moleques de rua que juntos não somavam 19 anos de idade! Foi parar no hospital. Após três dias internado tentou pela última vez descansar o corpo e a mente. Quem sabe no Cinema encontraria a alegria na arte da catarse? Coitado... Caiu desmaiado ao perceber que deveria encarar uma fila quilométrica cheia de crianças barulhentas, mães descontroladas e criaturas idiotas que fazem o favor de contar o final do filme antes de NÓS assistirmos!
Creio que foi desse momento em diante que as crises neuróticas dele deram um salto alucinante, tornando-se ainda piores. Sem alternativas, decidiu criar seu próprio tratamento: Não sairia mais de casa! Comprou uma vaquinha leiteira, sete galinhas caipiras e dois gatinhos vira-latas. Ergueu uma muralha de quase nove metros de altura a frente de sua casa e dispensou o portão de entrada. Muniu sua dispensa de sementes diversas, além de velas e candeeiros e alimentos para cerca de um ano até que sua horta estivesse pronta. Cavou um poço no meio da sala de jantar. Não receberia mais amigos e nem precisaria pagar contas de água pelo resto da vida. Família então? Nem queria saber de lembrar! Assim pensou que ficaria seguro de tudo e de todos. Aos poucos suas fobias realmente começaram a cessar. Já não tinha muito medo de morrer ou de ser assaltado... Já se sentia um pouco mais seguro. Em cinco anos o eremita da cidade já não se sentia mais amedrontado. Criara um mundo paralelo ao mundo real. Sua televisão servia de mesa de jantar. Enfim era o medo quem começara a morrer na cabeça daquele pobre homem perturbado que ainda não se sentia atraído pelas maravilhas do mundo contemporâneo.
Pois foi em uma bela tarde quente que ele decidiu se esbaldar na comilança. Estava mais alegre do que de costume. Sua roseira estava muito mais florida e a vaquinha havia produzido o mais puro leite. Como aquela vida era sossegada. Não havia perigo de morte por ali. Após muito comer, decidiu tirar um cochilo tranquilo, debaixo de um cajueiro viçoso que crescia em seu quintal que a essas alturas mais parecia a sede da Mata Atlântica. Não se sabe ainda como aquilo ocorreu, mas quando menos se esperou ele acordou apavorado e com uma bruta dor de barriga. Havia mesmo exagerado na lactose... Correu desesperado para o banheiro (ou o que lembrava um) a fim de aliviar aquele incômodo. Aquele reboliço era demais! Suava mais do que tampa de chaleira. Aquele tormento foi tanto que passou a afetar seu corpo inteiro. Começou a sentir-se fraco. Já não ouvia nem via bem...
Tuuuuudo
Eeeeesssstaaaaaaavvvvaaaa
ddiiiiiiiiiiiiiiisssssstaaaannntttttteeeeeee...
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Ali mesmo ficou... Morto! De um ataque cardíaco motivado por dor intensa e infecção generalizada no sistema digestivo motivada por ingestão exagerada a lactose! Um termo bonito para dizer que ele morreu de CA-GA-NEI-RA... Sei que não é algo culto e que muitos críticos literários que nunca fizeram cocô na vida vão achar estranho e repulsivo este meu relato, mas falo a verdade!
Só encontraram-no após quase um mês... Quando já fedia ao ponto de chamar atenção dos urubus... Logo o que ele mais temia aconteceu de uma forma inesperada... Ele que vivia fugindo da morte e de ameaças externas voltou ao barro do qual foi feito justo na hora que produzia um (barro).
Realçou sem querer o sacro pensamento de que “Adão foi feito do Barro e para o Barro voltará".