Muladeiro (capítulo VI)
Outros temporais vieram, outros janeiros e verões também. Princesa foi esquecida pelo patrão, e os dois irmãos nunca mencionaram sobre o sacrifício da mula, porque entenderam que pena maior era a do patrão, ter que omitir a vergonha da infertilidade por aquelas bandas, onde o que contava mesmo, era a casa cheinha de pirralhos. E o pequeno Antonio “esticava feito um elástico” conforme o pai comentava com vizinhos e amigos.
Alegrava aos irmãos, saber que Princesa morrera de velhice, e desde o acontecido e às ordens descumpridas, Israel cuidava da mula, para que nada de mal acontecesse a ela.
____Êta mula sabida, viu! Preferiu sumir pelo pasto de meu Deus, e morrer sem dá trabalho pra gente, né! Credo! Até parece que os animais sabe a hora de partir! Eu hein! – falava Israel ao irmão, que ria do seu jeito tosco, porém sincero.
Quando Antonio completou sete anos, pediu ao pai que o deixasse trabalhar na fazenda, porque gostava de estar no meio dos animais, ver o pai ordenhar as vacas, subir no ombro de Minduim e galopar com Israel. A mãe achava que seu filho era precoce, e não lhe agravada a ideia daquele toquinho de gente, enfurnar-se no serviço dos homens, mas não tinha voz ativa para segurá-lo. “Puxou ao pai”, dizia para si, Ernestina.
_____Filho, fico feliz por você gostar da fazenda e dos animais, mas no ano que vem, vai à escola. Sendo meu filho único, não permito um analfabeto nos Du Pont Soares. Eu sei assinar meu nome e ninguém me trapaceia no dinheiro, mas a preguiça me tomou conta, e pouco estudo tenho. Siga o modelo sua mãe. Lê, escreve e fala bem. Ninguém tapeia ela, quando o assunto é calcular. Meus pais, que Deus os tenha, não insistiram comigo. Me deixaram fazer de tudo, até fugir da escola.
____ Mas, pai! – resmungava o pequeno – a escola vai me servir pra quê? Gosto mesmo é dos animais. Com eles, eu não preciso nem saber falar bonito. Eles vão me entender é no chicote, nas ordens que vou dar. Eu sei que a professora não vai me ensinar, aquilo que o pasto já me ensina. Que coisa, pai!
Teodoro ria da fala do filho, notando profunda inteligência e percepção para as coisas da vida, em tudo o que o pequeno Antonio comentava. Não raro, ele falava sem parar com Israel, cuja paciência a tinha de sobra, sem contar que gostava da presença do garotinho, por quem pegou amor desde o dia em que o levou à casa de Mariquinha.
Perguntas e mais perguntas eram feitas a Israel, e desde que soubesse respondê-las, saciava a curiosidade da criança, que a cada dia, vinha com uma nova.