O "DOUTOR"

O dia amanhece. A cidade acorda para mais um dia, menos naquela praça onde uma aglomeração de pessoas insiste em continuar, vivendo e morrendo, num ciclo de destruição que atinge homens, mulheres e crianças.

De súbito, um carro de luxo para no local. Dele desce um homem de meia idade, alto e bem vestido. Ele olha em volta. Sente o clima. Vai até a mala do veiculo e retira várias bolsas contendo pães e garrafas de suco. Logo depois, se dirige aquelas pessoas. Alguns correm, outros ameaçam agredi-lo, alguns poucos o reconhecem. Trata-se do “Doutor” como é chamado por estes poucos. Simplesmente, alguém que, quase, todos os dias visita o local, ignora o odor, o panorama, as ameaças e distribui pão e suco. Dizem que é um advogado. Mas, ninguém sabe com certeza. Por isso contam algumas histórias, como a de um rapaz que ao receber e devorar o pedaço de pão, pediu: “Me ajuda doutor”; o homem olhou e respondeu: “Você tem certeza que quer mudar de vida?”; “Sim” disse o rapaz. “Doutor” ignorou o estado do viciado, levou-o até o carro e o levou. Dizem que o cara está se tratando e já fala em reconstrução de vida.

Muitos já ouviram a pergunta do tal homem: “Alguém aqui quer se recuperar?”. Mas, quase sempre ele ouve o silencio como resposta. Aí, distribui o lanche e vai embora. Dizem também, que o filho dele, ainda muito jovem, se envolveu com a tal droga e depois de meses de consumo morreu, mesmo com todas as tentativas do pai em recuperá-lo. Desde então, o “Doutor” insiste em visitar o tal jardim. Porém, ao certo ninguém sabe nada sobre ele.