A Surra
A surra
Lá pelas bandas do sertão mineiro, mais para o sul da Bahia, a vida nos anos 60 era muito difícil. Além de não se ter estradas, o meio de transporte mais comum eram no lombo de um cavalo ou em carro-de-bois, claro, existia o Trem que corria diariamente, mas que nem sempre dava acesso aos lugarejos que se necessitava.
A região era desprovida de rios ou córregos perenes o que se fazia necessário cada qual morador ter que providenciar os seus tanques para armazenarem água durante às chuvas e estes, serem os mananciais onde se pegava água para o consumo humano e também as criações durante o período de estiagem. Geralmente esses tanques ficavam próximos da casa, todos os dias era necessário encher os pequenos reservatórios - os potes de barro – de água e esta tarefa geralmente era feita carregando na cabeça. Mas nem sempre as chuvas eram o suficiente para encherem esses tanques, o que tornava à vida das pessoas naquela região um verdadeiro martírio, pois às vezes quando a seca era muito grande, até os rios mais próximos acabavam por secarem. E quando isso acontecia, era comum abrirem cacimbas no leito do rio e ficar a espera da água minar e ter quantidade suficiente para encher os vasilhames.
Seu Zezé, era um homem simples, trabalhador, de pouca cultura mas inteligente, preocupado em dar uma vida melhor para sua família, comprou uma pequena propriedade mais próximo do riacho e lá construíram uma casinha. Dona Fita sua esposa, muito trabalhadeira, sempre fora independente, gostava de ter o seu dinheirinho, ajudava muito o marido a ganhar o pão. Não era uma mãe carinhosa, também não era má, porém de pouco paciência. Falava baixo, não discutia nem teimava com os filhos, quando dava uma ordem falava apenas uma vez, na segunda já era com o corretivo, e isso era com cipó ou a alça em couro de um embornal.
Construíram também um poleiro, todos os dias à tardinha era necessário tocar as galinhas para o tal poleiro e isso ficava sempre à cargo do pequeno Tom, o caçula dos três irmãos.
Certo dia numa tarde, o sol já inclinando para o horizonte, Messias - um rapaz que morava com eles – estava saindo para ir buscar água no riacho, no carro-de-bois.
O tom sempre por aí com um facão velho na mão, facão esse que teria sido do seu avô. Gostava de ficar imitando seu pai, se sentia “homenzinho” quando estava com um facão na cintura.
Posso ir também, mãe? – disse ele.
Pode. Mas não leva o facão.
Ah, eu vou levar – retrucou.
Não, não leva.- Respondeu ela.
Eu vou levar – Disse ele mais uma vez.
Olha – disse ela – vai alí no mato e tira um cipó pra mim...
É pra bater nas galinhas? – perguntou ele.
É – respondeu.
Ele na sua inocência, escolheu o cipó que melhor pudesse fazer àquela tarefa e voltou todo feliz achando que iria para o riacho , entregando o cipó para a mãe.
Ela recebeu, segurou no braço esquerdo dele e lhe deu uma surra com àquele cipó, quebrando-o todinho nas suas pernas. Era um cipó fino e cada vez que batia nas suas perninhas ia soldando um pouco da casca. Açoitava com tanta força que o mesmo fazia barulho no ar, barulho que até hoje o Tom ainda é capaz de ouvir.
Isso é pra você não teimar mais com sua mãe – Disse ela.
Nas sua perninhas ficaram o vermelho das marcas do cipó e ele foi chorar num cantinho.