OSSOS DO OFÍCIO
Trabalhar na área sócio-trabalhista na agência bancária, em Jardinlândia, não era tarefa fácil. Os pagamentos do FGTS eram feitos quinzenalmente. Os funcionários do setor recebiam as "AM's", que eram os documentos hábeis a permitir a movimentação (saque) em conta do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, e iam separando numa calculadora os valores inscritos na conta gráfica (depósitos e juros e correção monetária), colocavam papel carbono nas três vias e, assim, datilografavam os dados obtidos.
Havia também o pagamento anual do PIS, que é um fundo do qual o trabalhador se beneficia recebendo um salário-mínimo, ou juros, de acordo com o seu salário e mês de nascimento.
Certa vez, apareceu lá um sujeito franzino, uns trinta anos, barba por fazer, muito humilde:
-Iêu vim recebê o "beu" PIS - falou com voz fanhosa.
Nino verificou a data de nascimento dele inscrita no cartão do PIS.
-O seu PIS vai ser pago só em setembro.
-Etão! Iêu vim in setebro.
-Mas nós ainda estamos em março e o senhor só poderá receber em setembro que vem - confirmou Nino.
-Etão! Iêu vim in setebro.
-Poi é! O senhor veio em setembro do ano passado e recebeu, não foi? - explicou calmante Nino.
-Ocê dum tem tulpa dão!
-Eu sei que eu não tenho culpa - respondeu Nino, compreendendo a dificuldade de entendimento daquele homem do povo.
-Etão!
-Então...!
-Etão!
-Então...!
-Ocê dum tem tulpa dão! - repetiu.
-Eu sei! O senhor volta aqui em setembro para receber o seu PIS, viu?
-Etão! Iêu vim in setebro.
Depois de muitos "Etãos", Nino convenceu-o a voltar em setembro.
-Ufa!
Nino não se aborrecia com essas pessoas, nem os maltratava, e também não gostava que alguns (poucos) o fizessem.