O DIA EM QUE JUVENAL FOI DESCOBERTO

Conheci um cara, que se tornou amigo, que sempre era visto como em devaneios. Trabalhávamos juntos. Ele era um tipo meio distraído, de modo que vê-lo com que nas nuvens era a coisa mais natural. Nosso chefe, que não era nada camarada, não passava um dia sem que lhe chamasse a atenção, às vezes à voz solta "Ô Juvenal, vamos rapaz anda, preciso desse orçamento pra hoje, pode ser?!" "Você está em que mundo, vamos meu camarada, as metas, temos que bater as metas, será que você entendeu?" E por muito tempo foi assim: o chefe brigando e o Juvenal viajando. Nosso amigo não era de falar muito da sua vida particular. Sabíamos que tinha sido casado, tinha três filhos do primeiro casamento e dois do segundo; nada mais que isso. Quando saíamos juntos ele logo dava tchau e sumia; de modo que pormenores de sua vida era impossível. Não era um tipo esquisito, mas o que sabíamos era que todo dia, ao dar o horário da saída, ele era o primeiro. Correu à boca pequena que Juvenal era meio pancada, pois, por mais de uma dúzia de vezes, ouviram ele falando sozinho no banheiro; chegaram até falar que dele ouviram, certa vez, algo como uma declaração de amor, era mais ou menos como " Vem meu amor. Estou louco pro nosso encontro. Não vejo a hora da saída para encontrá-la, todinha pra mim, e eu poder tê-la só pra mim. Você me enlouquece; quando a tenho em minhas mãos, esqueço de tudo e de todos. Senti-la na minha boca é tudo que quero, conto os minutos pra saída, só de passar as mãos em você, elas ficam toda molhada. Minha gostosa". Outra vez, quem nos contou só lembrava de ter ouvido algo como "Sei que muitos homens também te desejam, alguns até ensaiam com suas mãos, mas somente eu, eu mesmo, esse que sempre te tratou com carinho e mais que devoção, sabe saboreá-la" ou " estar com você, a qualquer tempo, chova ou faça sol, simplesmente não consigo ficar longe de você. Mesmo na praia com amigos, família e filhos, não consigo evitar; tenho que tê-la". De modo que por muito tempo Juvenal passou a despertar a atenção dos homens e certa repulsa das mulheres, principalmente quando Diana, a patinho feio da empresa, espalhou que ouvira Juvenal dizer "confesso que, mesmo contrariado, às vezes divido você com outros, mas somente quando estamos sós, é que me sinto feliz. Estar com você faz o tempo parar: já perdi hora do jantar, do jogo, mas, confesso, nunca fiquei nem um pouco arrependido. Nenhuma se iguala em nada a você; você é única". Durante muito tempo, não havia quem ficasse ao lado de Juvenal; não o convidavam para as festas de fim de ano, o excluíam do amigo secreto, quando alguém ficava doente mandava dizer que não receberia visitas porque estaria em casa de parentes, mas isso só valia pro Juvenal, porque os demais sabiam que não era bem assim. Esse mistério que se formou em torno da pessoa do Juvenal, durou o tempo suficiente, até que um dia, eu e mais dois amigos resolvemos que descobriríamos quem era a tal amada, a insubstituível, a única. Resolvemos que sairíamos uns quinze minutos mais cedo, com autorização do chefe, e ficaríamos na surdina. Assim que o Juvenal chegasse à rua, o seguiríamos. E assim tudo se deu. No dia combinado, o chefe nos liberou. Juvenal sai e nós o seguimos. Não demora muito ele para, dá um sorriso de satisfação e entra. Não era um lugar que frequentávamos, mas conhecíamos. Resolvemos esperar um pouso, pois queríamos pegar o Juvenal no flagra, com a boca na botija. Contamos até dez e..."vocês por aqui" nos disse o Juva, ficamos sabendo que assim era chamado. "Querem experimentar, com esse calor, vai que vai" Vendo que aceitaríamos, Juvenal, quer dizer, Juva, não fez rodeio, levantou os dois dedos e mandou trazer sua amada, a única, a insubstituível. Mandou o garçom trazer a cerveja.