Boa aparência
- Alô! Senhora Margarida Menezes?
- Sim, é ela.
- Boa tarde! Eu sou Paula Salem da RH Consultoria, e gostaria de falar com a senhora sobre uma ex-funcionária da sua empresa.
- Pois não. Qual funcionária?
- Maria Cristina Rocha. Estou com o currículo dela nas mãos e nele consta que foi na sua empresa o último lugar em que ela trabalhou. O currículo dela é muito bom, mas o fato dela ter trabalhado somente três meses com vocês me deixou um pouco receosa. A senhora era supervisora dela?
- Sim, eu fui supervisora da Cristina.
- E o que senhora pode falar sobre o trabalho dela?
- Cristina era uma excelente funcionária. Proativa, centrada, responsável, com vontade de progredir. Muito bem educada! Nunca faltou ao trabalho, nunca chegou atrasada e estava sempre disposta a ajudar os seus colegas de serviço. Enfim, era a funcionária que qualquer chefe quer ter.
- E por que ela ficou tão pouco tempo com vocês? O trabalho era temporário?
- Não. Era uma vaga efetiva...
Senhora Paula, Cristina é uma excelente moça. Ela tem um futuro promissor, com certeza. E terá feito uma excelente aquisição a empresa que a tiver no seu quadro de funcionários.
Cristina não pode permanecer conosco porque nossos clientes são muito tradicionais e exigentes. Um público diferenciado, a senhora me entende? Apesar de desempenhar muito bem as suas funções, o fato de Cristina ser diferente dos outros funcionários criava um certo constrangimento para todos, porque ela “destoava do conjunto”. Nossos clientes não ficavam a vontade, não gostavam de pedir informações sobre os nossos produtos para ela, chegando mesmo alguns a solicitarem que outra moça os atendesse. O volume de vendas em sua seção caiu e por conta disso foi preciso desliga-la, infelizmente!
- Mas senhora Margarida, o que a Maria Cristina tinha de diferente dos outros funcionários?
- Tudo! A começar pelo cabelo. Eu cheguei a sugerir para ela que o alisasse e pintasse de uma cor mais clara. Assim ela se pareceria mais com os outros funcionários. Eu também sugeri que ela parasse de tomar sol, e usasse uma base no rosto com uma tonalidade um pouco mais clara que a cor da sua pele. Talvez assim ela fosse aceita pelos clientes e pudesse se manter no emprego.
- Pelo visto ela não aceitou suas sugestões! Não é, senhora Margarida?
- Não! Ela não aceitou fazer isto. Disse que tinha orgulho de sua cor e de seus cabelos, e preferia ficar sem aquele emprego do que tentar ser alguém que ela não era. Eu lamentei muito ter que despedi-la, mas não tive outra alternativa.
- Obrigada pelas suas informações, senhora Margarida. Boa tarde!
- Paula, só uma pergunta, por favor: vocês pretendem contratá-la?
- Senhora Margarida, o currículo dela é muito bom, gostamos da entrevista que fizemos com ela e pelo que a senhora disse, ela foi uma excelente funcionária. Por mim, ela já está contratada.
- Ela merece. Eu tenho certeza que não vai se arrepender de escolhê-la.
- Agora eu tenho certeza que não me arrependerei, senhora Margarida. Senhora Margarida, só para lhe deixar ciente: eu também sou negra!