Um anjo para Deus
A gente chegou quatro da manhã na fila! Quatro da manhã! Que judiação! Uma mãe e seu bebezinho, trazido enrolado numa manta num dia frio.
Disseram que faltava médico. Fizeram ficha e mandaram esperar, em algum canto do corredor lotado.
“Tinha casos mais urgentes. Não tinha maca, remédio ou quarto, mas tinha fila pra enfermaria. Os médicos estavam em greve, e o que ficara, se virava como podia.”
- Moça, meu filho tá muito doente!
Fiquei ali desesperada, ninando o meu filhinho. Voltar pra trás não podia: ir pra longe, pra casa, sem dinheiro, com o menino de febre pelando.
- Moça, não tô aqui brincando!
Calma, filhinho, calma. Espera. Você já vai ficar bom. O médico já vai atender. Você vai tomar remédio e melhorar. Voltar pra casa com a mamãe e esperar o papai chegar. Vamos fazer festa pra nosso anjinho, quando completar um ano!
- Moça, meu filho tá piorando!
Descansa meu filhinho. Fecha os olhinhos e dorme. Mamãe vela por você. Assim que o médico aparecer mamãe te acorda. Agora descansa. Dorme, dorme, meu filhinho.
- Moça, tá demorando demais. Eu preciso do médico agora! Agora!
Aguenta filhinho, aguenta. Olha, tua febre já tá passando. Olha, você não arde mais nem sua. Já tá ficando bonzinho e o médico nem te atendeu. Eu vou sentar aqui com você, e descansar um pouquinho...
...
...
...
- Acorda, mãe, acorda! A senhora precisa dar a criança. Não pode mais ficar com ela!
- Mãe, seu filho não respira. Está roxinho, gelado. A senhora precisa dar ele, mãe. Precisamos levá-lo!
- Mãe, não pudemos fazer nada. O socorro veio tarde!
- Não foi culpa nossa mãe! Tinha de acontecer! Ele aqui vir aparecer, logo em um dia de greve!
- Se acalma, mãe! Se acalma! Não adianta fazer escândalo! Querer chamar televisão, processar o hospital ou o governo!
“Foi Deus que quis levar o seu anjinho pra junto dele!”