De carona
Lana estava tão agitada. Seu pai passou um pouco mal com a pressão alta. Trabalhou o dia inteiro sob o sol forte, no final do dia, já estava sem forças e o corpo protestou, levando sua pressão a se elevar. Não era nada grave, mas os médicos acharam melhor ele ficar de repouso no hospital, assim evitaria qualquer esforço. Ele ficaria em boas mãos, além das enfermeiras, sua mãe passaria a noite com ele. Lana estava bastante cansada e queria voltar para casa, foi até o quarto deixar um beijo no pai que já dormia, depois se despediu de sua mãe que estava preocupada com ela.
- Filha, tem certeza de que não quer chamar um taxi? Deve estar muito cansada para dirigir.
- Tudo bem, mãe! Consigo ir para casa numa boa.
- Filha, você esta quase dormindo em pé.
- Mãe, eu posso... – Ela mal terminará a frase, logo foi interrompida por alguém atrás dela.
- Não se preocupe senhora, eu a deixo em casa. – Disse uma voz que ela reconhecia, era Thiago, um colega da faculdade. – Não seria nenhum problema.
Lana ficou imóvel por um instante. Thiago não era apenas um colega, era alguém que ela sentia uma admiração além do normal. Era apaixonada por ele, mas não se dava conta.
- Não precisa se incomodar. Posso ir sozinha.
- Não seria incomodo, também estou indo pra casa. – Ele tomou a sua frente e estendeu a mão, cumprimentando a mãe de Lana. – Oi, sou Thiago, estudo com a Lana.
- Olá, também estuda Arquitetura?
- Não, direito – disse Lana. – E já disse, não precisa me levar.
- Filha, vá com ele, você está muito cansada.
Não iria adiantar Lana insistir, conhecia bem sua mãe e ela seria persistente. Porém, o que mais irritava Lana, era que estava absolutamente incomoda com a presença de Thiago e com o fato de levá-la para casa. Esperava que ninguém notasse o rubor em seu rosto, deveria estar mais vermelha do que se tivesse passado um dia inteiro embaixo do sol. Por fim, acabou cedendo.
- Tudo bem, pode me levar.
- É melhor assim, minha filha. Aqui está a chave do carro.
- Estou com meu, senhora. Não se preocupe. – Cumprimentou a mãe de Lana novamente e se virou para ela. – Vamos?
Ela quase não conseguia o responder, apenas assentiu com a cabeça e se despediu de sua mãe.
- Boa noite mãe, qualquer coisa me liga.
- Boa noite, descanse filha.
- Vou cuidar para que ela faça isso.
- Obrigado, tem café e bolo, Comam algo quando chegarem. Ambos devem estar cansados.
- Mamãe... - Lana protestou, e seguiu em direção a porta de entrada do Hospital.
Seguiram para o estacionamento e Lana abriu o carro, se sentando no banco de passageiros e entregou a chave a Thiago. Não precisou dizer onde era sua casa, eles moravam na mesma rua. O percurso de dez minutos foi silencioso, quase não conversaram, só quando estavam quase chegando, Thiago quebrou o silencio.
- Seu pai está bem?
- Sim, só vai ficar em observação, ele não ficaria quieto em casa então decidimos que ele poderia passar a noite lá.
- Ah, entendo... Chegamos.
Thiago estacionou o carro na frente da casa de Lana e saíram do carro.
- Obrigado por me trazer.
- Imagina, eu já estava voltando pra casa.
- Mesmo assim, obrigada.
- De nada... – Ele sorriu e se virou, voltando para o carro.
Lana ficou o observando, se deu conta que, desde que estudavam juntos, pouquíssimo se falavam, e nessas poucas vezes nunca foi diretamente, era sempre em alguma conversa com amigos em comum, ou então, ficava o observando de longe, observando seus jeitos, atitudes, seu sorriso. Se achou uma tola por isso.
- Espera – Disse ela, o parando antes de entrar no carro. – Você deve estar cansado também.
- É, um pouco.
- O que fazia no hospital?
- Estagio. Passei o dia em uma simulação de assassinato. Na verdade estou lá desde ontem à tarde.
- Poxa, e não dormiu nada até agora?
- Não, estou a umas vinte e oito horas sem dormir.
- E não está com sono?
- Não agora, acho que quando eu for descansar irei apagar.
- Ah, bem... Então, é... – Lana estava começando a ficar sem palavras, mas lembrou que sua mãe disse sobre bolo e café. – Aceita um café?
Thiago ficou surpreso com o convite, cogitou não aceitar mas, pela primeira vez eles estavam conseguindo conversar. Diferente de Lana, ele não escondia de ninguém seu interesse por ela, não tinha como disfarçar o sorriso quando ela estava com ele e seus amigos. Mesmo ela não conversando diretamente com ele.
- Seria ótimo.
Lana sorriu, e acenou para que a seguisse. Eles entraram em casa e foram para a cozinha. Ela colocou duas xícaras na mesa, e serviu o café e junto com um bolo de laranja.
Eles tomaram seus cafés enquanto conversavam sobre a faculdade, sobre seus pais, alguns amigos. Era como se toda a conversa atrasada entre eles, fosse posta em dia. Depois foram para a sala, onde continuaram conversando e assistindo uma série policial.
- Você acha que eles exageram nessas séries? – Questionou Lana.
- Sim, acho. Tem muitas coisas impossíveis, esses computadores de alta geração, por exemplo.
- Foi o que imaginei.
As horas se passaram, a série acabou e sem perceberem, acabaram adormecendo. Durante a madrugada, Lana acordou com o celular vibrando em seu bolso. Assustou quando percebeu que horas eram e que tinha adormecido nos ombros de Thiago. Ficou tão surpresa, que levantou correndo, ele estava tão cansado que nem notou sua movimentação.
Ela sentiu uma pontada de pena dele, não queria acordá-lo. Foi até seu quarto e buscou um cobertor para cobri-lo. Com todo cuidado, colocou o cobertor sobre ele.
- Boa noite. – Disse ela, num tom tão baixo, que era impossível de se ouvir.
Voltou para o quarto, trocou de roupa e dormiu.
Eram quase nove da manhã quando ela acordou. Meio zonza, tentou se lembrar da noite passada, e ficou na dúvida se era realidade ou sonho. Assim que chegou a conclusão da realidade, se levantou num pulo, trocou de roupa, fez sua higiene e voltou para a sala. Mas ele não estava lá, tinha sido um sonho. Ficou decepcionada, estava tão contente em a companhia dele. Se sentou no sofá onde achou que ele havia passado a noite, estava frustrada, até que olhou para o lado e viu um cobertor dobrado. Agora ela estava realmente confusa. Talvez ele tivesse ficado com ela noite passada, mas já se foi.
- Bom Dia.
Não, ele não tinha ido embora. Ela se levantou do sofá e se virou para encará-lo.
- Oi, é... Bom dia.
- Desculpe o incomodo, eu devia ter ido embora depois do café.
- Não tem problema. – E não tinha problema algum, ela estava feliz por ele ainda estar ali. – Dormiu bem?
- Como um anjo.
- Que bom... Vou preparar um café.
- Não se preocupe com isso, tomei a liberdade de preparar.
- Sério?
- Você se incomoda?
- Não... bem, então vamos tomar café.
Quando chegaram a cozinha, ela se espantou com duas coisas.
Primeiro, ele tinha lavado a louça de ontem a noite. Segundo, a incrível mesa do café. Ela estava incrível, tinha de tudo, frutas, pães, suco, café, leite, flores... Flores? Ela não acreditava no que via, ficou hipnotizada, mas o que mais chamou sua atenção foram as flores.
- Quando... quando...?
- Eu acordei muito cedo, você ainda dormia, queria retribuir a hospitalidade. Você gostou?
Gostar? Gostar não era nada, ela ficou apaixonada.
- É lindo.
- Sente-se. – Ele puxou uma cadeira e acenou para ela se sentar e em seguida sentou a sua frente. Pegou as flores e a entregou. – São pra você, rosas azuis. São feitas artificialmente, mas não deixam de ser tão lindas como as naturais.
- Obrigada. – disse ela sem jeito – Elas são lindas, são incríveis.
- Como você. – disse ele num pensamento alto.
- Hã?
- Não é nada, pensei alto...
Seguiram tomando seus cafés, ele sempre a servindo. Logo terminaram, e precisavam voltar ao hospital. Ela pegou carona com ele novamente, dessa vez conversaram um pouco mais, cantaram as musicas que tocavam no radio. Por fim, chegaram ao hospital.
- Você tem simulado hoje?
- Na verdade não, só quis te dar uma carona.
Ela ficou sem graça, abaixou a cabeça e pensou “ele é incrível”.
- Acho que tenho que ir, meu pai já deve ter tido alta. Obrigada pela companhia.
- Eu que agradeço.
- Tchau. – Ela se despediu com um beijo no rosto.
- Tchau, a gente se vê na faculdade.
- Sim...
Assim, ela desceu do carro. Feliz pela noite agradável, ele também seguiu caminho, tão feliz quanto ela.