A tecelã a Formiga e o Universo
A tecelã a Formiga e o Universo (Conto)
“Partículas de poeira estelar somos nós humanos, no quadro cósmico da criação somos pequenos, mas ainda sim, dentro do mundo criado por nossa mente, somos os grandes cérebros pensantes em um vasto e solitário espaço, onde estrelas e planetas existem por acidente, ou unicamente para inspirar nossa natureza contemplativa e nossa ânsia por desbravar os mistérios que estão além de nossa raquítica percepção?
Mesmo tão pequenos, somos nós tão ousados, e nossa impertinência e petulância talvez cause admiração em inteligências superiores a nossa, talvez por isso deuses se manifestem entre nós e tentem nos contar o mecanismo que nos cega, e por assim ser, o que não vemos logo se torna fantasia, sandices e até os deuses que nos auxiliam perdem credibilidade por conta de nossa cegueira.”
Fechei o bloco de notas, pois logo partiria o trem e o seu sacolejar me impediria de escrever, porem continuei amadurecendo em minha mente todos aqueles pensamentos que vinham de uma só vez ... Passei a observar meus companheiros de vagão, todos misturados, apertados, sorvendo um do outro o vapor quente que se desprendiam de suas peles; vestimenta de carne maltratada por tanto cansaço.
Olhei nos olhos dos que estavam ao alcance de minha visão, alguns perceberam e mostraram desconfiança ao virarem os rostos, outros me olharam de volta, mas vazios, distraídos não me viam, e a grande maioria se quer notou meu olhar analítico.
Entrei no campo desconhecido da estranheza, uma certeza penetrou em meu ser de que eu era a única ali questionando sua progênie cósmica, o único ser tentando enxergar além de sua própria capacidade de ver; não me esbaldei na superioridade, muito pelo contrario, me senti arrogante, eu estava em meio a pessoas que estavam superando os problemas inerentes a vida, pensando em trabalho, ou, em descansar, estas pessoas estavam vivendo o “matar e morrer” terrestre, dilemas que para mim são efêmeros. Respirei fundo...
Uma voz falou dentro de meu peito, criando uma ressonância por todo meu corpo...
“Não, não são efêmeros, são partes de um corpo ao qual também fazemos parte, não existem retrocessos, todos caminham para a mesma luz, esta é a maravilha deste planeta, todos são o que são, no mesmo espaço, caminham vários caminhos que se formam dentro de uma única estrada, não há maior, ou menor, todos estão seguindo...Sempre em frente”
Deus?
Não sei, mas posso dizer que o amor tomou conta do espaço ocupado pela solidão, e eu que em minha prepotência sempre julguei a humanidade como se dela não fizesse parte, amei cada ser humano, e ali naquele vagão, eu era um único corpo e conhecia individualmente cada parte dele...
Diante o nascer deste amor, acredito que o deus que tocou meu coração com tamanho amar, é o deus que habita em mim, o meu “eu” sagrado, que é calado e sufocado por minha sordidez, e por minha incredulidade.
Ignorei o sacolejar do trem e abri novamente o bloco de notas...
-Uma porta se abre permitindo a luz do sol iluminar a simplória cabana enquanto uma senhora de meia idade ganha o gramado verde que se estendia a frente unindo-se ao horizonte montanhoso de onde vinham os raios solares.
A senhora trazia embaixo dos braços três enormes peças de tecido.
Um vapor branco e maciço misturava-se ao ar vindo de trás da casa, lugar para onde seguiu a senhora.
Atrás da casa tachos borbulhantes de pigmento solucionava o misterioso vapor. A senhora deixou cair o linho fino que recentemente acabara de tecer, tomou-se de um rústico banco baixo de madeira e sentou-se a fim de analisar se haviam falhas em sua criação; passado algum tempo, levantou-se com um dos tecidos e o jogou em um dos tachos, e assim fez com os outros...Um processo demorado que exigia total atenção da tecelã.
No dia seguinte, todos os estágios de pigmentação haviam sido concluídos e então a tecelã lavou cada tecido na água corrente de um pequeno rio próximo de sua casa, os estendeu sobre o gramado para que o sol fizesse seu trabalho.
Sobre a grama a beira do rio estendidos estavam: Um tecido azul, um amarelo, e o mais bonito de todos, o vermelho encarnado; eram encomendas feitas pelo senhor da vila em que vivia a tecelã.
Mas, teremos de apurar nossa visão, pois as personagens principais seguem por entre a grama, invisíveis. Um grupo de formigas operarias; saíram em busca de alimento para preparar o formigueiro, pois o inverno logo vinha.
No meio do caminho as formigas se depararam com a barreira criada pelos tecidos estendidos da tecelã, a barreira parecia interminável, então o grupo foi separado em três grupos e cada novo grupo tomou um caminho. Terrível destino, lugar inóspito e vasto, cada grupo viu-se cercado por um universo infinito, onde tudo parecia ter a mesma composição.
O grupo que caminhava sobre o tecido azul não podia cogitar que suas outras amigas estavam sobre tecidos de outras cores, e assim era com as outras, perderam-se na vastidão dos tecidos e foram limitadas pelo tamanho minúsculo de suas existências, ficaram dando voltas e voltas e voltas... Tanto tempo possou que suas memórias já haviam sido afetadas, os grupos não lembravam mais de onde vieram e porque vieram; não se lembravam de que aviam se dividido, cogitar então que outras de sua espécie estavam perdidas na vastidão de outras cores era impossível...
O formigueiro não teve um farto e confortável inverno e suas operarias morreram; um grupo crendo que só existia amarelo, outro que existia apenas azul, e outro acreditando que tudo se resumia no vermelho encarnado. No entanto, passado muito tempo, uma sonhadora formiga se apresenta no formigueiro, contou sua aventura, disse que todo o tempo que caminhava na vastidão azul onde se perdera com suas amigas, lembrava-se vagamente do verde das folhas, da cor da terra, do vermelho dos frutos, e de seu propósito com o formigueiro e isso a fez seguir e não se conformar com o fim no mundo de uma cor só, até que um dia, já sozinha, chegou ao fim de sua prisão, e deparou-se com um gramado verdinho e orvalhado, notou que existia horizonte, e que neste horizonte existia azul também que por vezes tornava-se negro, nunca havia percebido que acima de sua cabeça, existiam folhas suspensas por troncos, embora antes de se perder, subia por estes troncos, percebeu também as montanhas, os pássaros, tudo o que antes de se perder no tecido azul não havia percebido... Vivendo a descoberta de um mundo muito mais rico seguiu para a montanha onde estava seu formigueiro. Ao chegar ao topo olhou para baixo e se espantou com o que viu, viu a casa simplória, o vapor, a velha tecelã, que recolhia os mundos no qual se perderam suas amigas.
Atônita a formiga pensou...
“Em que mundo estendido sobre outro mundo, vive esta mulher?”
A moral da historia não é apenas uma, cada um irá tirar dela sua própria moral de acordo com o seu entendimento e o seu momento no grande tecido cósmico em que vivemos... Por isso não irei influenciar com a minha moral, pois desejo todos livres para pensar.
Luana Thoreserc
Mesmo tão pequenos, somos nós tão ousados, e nossa impertinência e petulância talvez cause admiração em inteligências superiores a nossa, talvez por isso deuses se manifestem entre nós e tentem nos contar o mecanismo que nos cega, e por assim ser, o que não vemos logo se torna fantasia, sandices e até os deuses que nos auxiliam perdem credibilidade por conta de nossa cegueira.”
Fechei o bloco de notas, pois logo partiria o trem e o seu sacolejar me impediria de escrever, porem continuei amadurecendo em minha mente todos aqueles pensamentos que vinham de uma só vez ... Passei a observar meus companheiros de vagão, todos misturados, apertados, sorvendo um do outro o vapor quente que se desprendiam de suas peles; vestimenta de carne maltratada por tanto cansaço.
Olhei nos olhos dos que estavam ao alcance de minha visão, alguns perceberam e mostraram desconfiança ao virarem os rostos, outros me olharam de volta, mas vazios, distraídos não me viam, e a grande maioria se quer notou meu olhar analítico.
Entrei no campo desconhecido da estranheza, uma certeza penetrou em meu ser de que eu era a única ali questionando sua progênie cósmica, o único ser tentando enxergar além de sua própria capacidade de ver; não me esbaldei na superioridade, muito pelo contrario, me senti arrogante, eu estava em meio a pessoas que estavam superando os problemas inerentes a vida, pensando em trabalho, ou, em descansar, estas pessoas estavam vivendo o “matar e morrer” terrestre, dilemas que para mim são efêmeros. Respirei fundo...
Uma voz falou dentro de meu peito, criando uma ressonância por todo meu corpo...
“Não, não são efêmeros, são partes de um corpo ao qual também fazemos parte, não existem retrocessos, todos caminham para a mesma luz, esta é a maravilha deste planeta, todos são o que são, no mesmo espaço, caminham vários caminhos que se formam dentro de uma única estrada, não há maior, ou menor, todos estão seguindo...Sempre em frente”
Deus?
Não sei, mas posso dizer que o amor tomou conta do espaço ocupado pela solidão, e eu que em minha prepotência sempre julguei a humanidade como se dela não fizesse parte, amei cada ser humano, e ali naquele vagão, eu era um único corpo e conhecia individualmente cada parte dele...
Diante o nascer deste amor, acredito que o deus que tocou meu coração com tamanho amar, é o deus que habita em mim, o meu “eu” sagrado, que é calado e sufocado por minha sordidez, e por minha incredulidade.
Ignorei o sacolejar do trem e abri novamente o bloco de notas...
-Uma porta se abre permitindo a luz do sol iluminar a simplória cabana enquanto uma senhora de meia idade ganha o gramado verde que se estendia a frente unindo-se ao horizonte montanhoso de onde vinham os raios solares.
A senhora trazia embaixo dos braços três enormes peças de tecido.
Um vapor branco e maciço misturava-se ao ar vindo de trás da casa, lugar para onde seguiu a senhora.
Atrás da casa tachos borbulhantes de pigmento solucionava o misterioso vapor. A senhora deixou cair o linho fino que recentemente acabara de tecer, tomou-se de um rústico banco baixo de madeira e sentou-se a fim de analisar se haviam falhas em sua criação; passado algum tempo, levantou-se com um dos tecidos e o jogou em um dos tachos, e assim fez com os outros...Um processo demorado que exigia total atenção da tecelã.
No dia seguinte, todos os estágios de pigmentação haviam sido concluídos e então a tecelã lavou cada tecido na água corrente de um pequeno rio próximo de sua casa, os estendeu sobre o gramado para que o sol fizesse seu trabalho.
Sobre a grama a beira do rio estendidos estavam: Um tecido azul, um amarelo, e o mais bonito de todos, o vermelho encarnado; eram encomendas feitas pelo senhor da vila em que vivia a tecelã.
Mas, teremos de apurar nossa visão, pois as personagens principais seguem por entre a grama, invisíveis. Um grupo de formigas operarias; saíram em busca de alimento para preparar o formigueiro, pois o inverno logo vinha.
No meio do caminho as formigas se depararam com a barreira criada pelos tecidos estendidos da tecelã, a barreira parecia interminável, então o grupo foi separado em três grupos e cada novo grupo tomou um caminho. Terrível destino, lugar inóspito e vasto, cada grupo viu-se cercado por um universo infinito, onde tudo parecia ter a mesma composição.
O grupo que caminhava sobre o tecido azul não podia cogitar que suas outras amigas estavam sobre tecidos de outras cores, e assim era com as outras, perderam-se na vastidão dos tecidos e foram limitadas pelo tamanho minúsculo de suas existências, ficaram dando voltas e voltas e voltas... Tanto tempo possou que suas memórias já haviam sido afetadas, os grupos não lembravam mais de onde vieram e porque vieram; não se lembravam de que aviam se dividido, cogitar então que outras de sua espécie estavam perdidas na vastidão de outras cores era impossível...
O formigueiro não teve um farto e confortável inverno e suas operarias morreram; um grupo crendo que só existia amarelo, outro que existia apenas azul, e outro acreditando que tudo se resumia no vermelho encarnado. No entanto, passado muito tempo, uma sonhadora formiga se apresenta no formigueiro, contou sua aventura, disse que todo o tempo que caminhava na vastidão azul onde se perdera com suas amigas, lembrava-se vagamente do verde das folhas, da cor da terra, do vermelho dos frutos, e de seu propósito com o formigueiro e isso a fez seguir e não se conformar com o fim no mundo de uma cor só, até que um dia, já sozinha, chegou ao fim de sua prisão, e deparou-se com um gramado verdinho e orvalhado, notou que existia horizonte, e que neste horizonte existia azul também que por vezes tornava-se negro, nunca havia percebido que acima de sua cabeça, existiam folhas suspensas por troncos, embora antes de se perder, subia por estes troncos, percebeu também as montanhas, os pássaros, tudo o que antes de se perder no tecido azul não havia percebido... Vivendo a descoberta de um mundo muito mais rico seguiu para a montanha onde estava seu formigueiro. Ao chegar ao topo olhou para baixo e se espantou com o que viu, viu a casa simplória, o vapor, a velha tecelã, que recolhia os mundos no qual se perderam suas amigas.
Atônita a formiga pensou...
“Em que mundo estendido sobre outro mundo, vive esta mulher?”
A moral da historia não é apenas uma, cada um irá tirar dela sua própria moral de acordo com o seu entendimento e o seu momento no grande tecido cósmico em que vivemos... Por isso não irei influenciar com a minha moral, pois desejo todos livres para pensar.
Luana Thoreserc