O projeto e o imponderável

Era um projeto dos anos sessenta. Os anos dourados com uma moral piedosa, como aquelas cangas que os bois carregam pela estrada; e, por que a estrada é por vezes tão bonita, não se percebe o peso que nos oprime. Mais tarde, a estrada perde o encanto, chove e o lamaçal envolve nossos passos, pedrinhas machucam nossos pés. Meu projeto esbarrou no imponderável; nem me casei na igreja, nem meu vestido foi tão branco com cauda tão, tão longa, ou meus irmãos cantaram canções da infancia ao pé do altar e nem meu noivo foi tão qualificado; e a aliança que eu amava tanto perdeu sua essencia e o valor da unicidade - ficou se chamando desenlace ou algo semelhante. Aos tropeços, dei com a porta da vida na cara.Criei, me agoniei, juntei, despedacei, recriei...coisas da vida. Por que será que hoje, já mais veha e sábia, catando ainda aí pedaços de mim mesma, me lembrei desse projeto tão, tão antigo? Da aliança de unir e do vestido branco de cauda tão longa com um véu feito de nuvens que jamais usei?