CADEIAS
 
 
Marcelo é um homem no auge dos seus quarenta anos. Funcionário bem sucedido de uma grande empresa. Suas remunerações são excelentes. Detém um patamar de vida que muitos homens almejam nesse meio competitivo rumo às conquistas materiais. Ele se porta em excelente forma física, afinal sempre reservou algum tempo para a academia. É solteiro e mora sozinho em num apartamento localizado na parte mais cobiçada da cidade. Geralmente sai com todas as mulheres que deseja, e pode viajar para fora do país no momento que quiser.
 
No entanto, algo o incomoda em certos dias, é alguma necessidade não suprida e indefinida que se faz presente no seu eu. Ultimamente anda se sentindo indisposto e sem motivações para o estilo de vida que tem. Certas vezes aflorara no seu interior ânsia súbita de largar tudo que conquistou e ir fazer outra atividade, a qual não sabe especificamente definir. Tem sido acometido frequentemente com ondas de estresse e certas negociações com alguns clientes têm sido fracassadas, devido sua irritação e impaciência no manejo do negócio.
 
Sim, ele já foi casado com Valéria e entre idas e vindas durante os dois anos que dividiram o mesmo espaço, decidiram, sem lamentações, seguir separados. A relação do casal não deixou herdeiros e nem rancores.
 
O fato é que Marcelo hoje, depois de mais uma noite de farra, se posta na janela de seu apartamento olhando o tempo e a mesma insatisfação de outras vezes se faz presente no seu eu, e, em meio a sua irritação inexplicável, percebe o toque do telefone onde verifica a chamada que não surte em si o desejo de atender a mais uma das mulheres vazias que anseiam sua companhia. Assim, decide encarar o chuveiro quente seguido de roupas limpas e logo se atreve a movimentar o corpo na busca por distração nesse vagar incerto pela orla da praia de Ipanema, onde se depara com um moço hippie (desses que andam por aí no ostracismo social).
 
Sustentando as mãos ocultas nos bolsos, Marcelo fica por tempo indeterminado a observar o hippie na simples vendagem dos acessórios pessoais que o sustenta na sobrevivência diária. A curiosidade o faz finalmente se aproximar do viajante descompromissado para alguma conversa informal, e forjando interesse nos colares artesanais desencadeia assunto irregular:
 
- Você circula por outras praias brasileiras?
 
A conversa flui bem entre os recém conhecidos. Marcelo oferece e também ingere algumas cervejas, enquanto desvenda que o hippie à sua frente já viajara até mesmo para outros países e que percorre lugares desconhecidos há cinco anos, e que também fora a melhor decisão que tomara para si. O viajante afirma convicto que antes era um homem que se sentia aprisionado, angustiado, que só pensava em acumular bens sem sentir real prazer no que fazia e na vida que vivia.   Era um verdadeiro boneco do consumo exacerbado dessa globalização absurda, ao ponto de nem mais identificar seus próprios desejos de tão impulsionado a agir mediado pelas inúmeras e ocultas vozes vindas de todos os lados.
 
A conversa se prolonga tarde adentro. Marcelo segue nutrido por uma suavidade capaz de ser percebida no brilho de seus olhos que se deixa envolver pela fantasia libertadora que embarca nesta tarde ensolarada na cidade do Rio de Janeiro...
 
 
 
 
Pro: Valdon Nez
Em: 22 Setembro 2012.
Valdon Nez
Enviado por Valdon Nez em 22/09/2012
Reeditado em 20/10/2020
Código do texto: T3894943
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