A Vinda e a criança
A Vinda e a criança
E a criança olhou a noite que corria desesperadamente pelo vale, viu os passarinhos que confabulavam baixinho saírem de seus ninhos, em busca de abrigo comum gaviões e maritacas, papagaios e todas as aves que voam sobre a terra escurecendo ainda mais o céu e animais de todas as florestas, hienas e leões, girafas e pacas, todos, todos, todos juntos, as aves, os insetos, os felinos, os que rastejavam ou não e o céu se fez cinza e se abria e fechava compassadamente num outro tom de cinza-escuro e figuras sem forma volteavam em gritos horrendos por sobre a terra eis que os humanos assustados, muito já feridos, procuraram os seus pares em meio ao terror e permaneceram juntos os bons, os éticos, justos e tolerantes, misericordiosos e compassivos e, ao mesmo tempo um outro grupo se formava sem que se pudesse lutar contra isso, uma força invisível que empurrava os maus, gananciosos e intolerantes, venais e grosseiros para um outro lado da terra e se batiam com socos e pontapés, todos correndo para o nada em desespero contínuo procurando um abrigo que os pudesse afastar das figuras que se multiplicavam no ar - e era um ar que aos poucos, ia se tornando fétido, humanos e animais respiravam agora com dificuldade , as narinas escorrendo sangue,mães apertavam seus filhos contra o peito e gritavam por clemência ao vazio; as figuras sem forma foram se juntando até formar imensa figura escura que se contorcia para a direita e para a esquerda, ora urrava, ora emitia som fino que feria os ouvidos, ora gargalhava e tocava algum humano incauto que se desfazia em pedaços sangrentos. Os mares e oceanos endureceram e a terra transformou-se numa imensa planície esverdeada onde odor nauseabundo se espalhava pela planície com sofreguidão. Nesse instante a criança pede a seus pares que se acalmem e, do lado extremo da terra dir-se-ia, não uma luz, mas milhões delas que surgiram contra um céu de azul espantosamente delicado, onde figuras vestidas de ar, ou o que a ele se assemelhassem, cobriram o céu e ouviu-se uma voz tão misericordiosa e pungente, tão encantadora e delicada que os humanos prostaram-se perante ela, grande maioria chorando copiosamente e que repetia a frase em meio a um cântico completamente desconhecido e mavioso para os ouvidos humanos: Eu sou a Luz do mundo – quem me segue não andará nas trevas, mas terá luz eterna! E foi nesse exato instante que a figura escura contorceu-se em desespero jamais visto e brandindo uma foice, avançou por sobre a Luz e ao tocá-la levemente foi acometida de tal horror e pavor que transformou-se quase que de imediato em monte de cinzas que voaram pelos ares por entre a multidão aturdida, uns que rezavam, outros que choravam e se abraçavam, outros ainda, mais afoitos e cheios de esperança e fé, tentando agarrar a Luz. A morte fora vencida . Como o Cristo nos prometeu. E a criança sorrindo, foi ao encontro de seu Mestre.