O cortejo

A procissão corria solta ladeira abaixo. Do alto do morro, na rua Dos Ventos, até a entrada do cemitério, dava uns dois quilômetros. O cara não era grande e nem tão forte, mesmo assim o caixão devia está pesando uns duzentos quilos. Mas ninguém reclamava. O morto era muito querido, principalmente pelas viúvas que seguiam o féretro.

– Homi bão! Nunca vi igual. Dizia uma.

– É! – afirmava a outra.

A turma descia a serra. Um choro aqui, outro acolá e todo mundo tinha sempre algo a dizer sobre o defunto. Na maioria das falas, o que se ouvia era sobre o tom corajoso e destemido de Frederico Cunegundes Queiroz. Cidadão de bem, de muitas posses e de nove mulheres, vinte e sete filhos, doze netos e dois bisnetos. Nenhum dos meninos deu para o que não prestasse. Tudo trabalhador e honesto.

A fama de mulherengo veio quando ele teve o primeiro casamento com dona Gervásia. A mulher mais bonita da região na época. Ele sempre fora galanteador e aquela seria a conquista que todos queriam ver dando certo. A mulher caiu na lábia do velho e ainda fez sua fama de bom amante. AÍ pronto. Foi o que faltava para todas as outras quererem ver o que ele tinha de tão especial.

– Menina, Nunca vi nada igual! Arrotava a primeira-dama do coração vagabundo.

Para cada mulher, depois de Gervásia, ele viveu quatro anos, tinha três filhos e já sumia no mundo em busca de novas aventuras. Nessas andanças foi casando e descansando até atingir a soma de nove mulheres. Todas com o mesmo ritual e a mesma fama. Dizem as ex, que são amigas e confidentes, que tão boa era a convivência com o galã. Dizem também que nenhuma delas, depois do velho Frederico, quis saber de outro homem.

– Minha “periquitinha” não vai mais ver a rola de ninguém. Dizia Antônia, sua quinta companheira.

Atualmente dividia o teto, oficialmente, com Francisca e sempre que podia visitava as ex. Segundo ele, era “só para ver os meninos”. Mas que nada. Todo mundo sabe que ele ia mesmo era matar a saudade e renovar o paladar. O cabra não sossegava. Tinha cento e quatro anos e era de constranger qualquer garotão. E não tinha muita coisa, não. Chegava no lugar, a mulher olhava e já estava dominada.

– Parece feitiço. Disse entre sussurros, Margarida, a sétima.

A cidade tinha até um motel especializado na terceira idade. Era porque em Paraíso do Norte o número de homens com idade entre sessenta e cinco e cem anos era muito grande. O município possuía o menor índice de pessoas na terceira e quarta idade com problemas de saúde.

O estabelecimento do amor tinha o nome sugestivo de SEX-agenário. E, ainda, tinha promoções interessantes, por exemplo: uma dizia que se o cabra ficasse mais de três horas, a quarta seria grátis, ganhava uma camisinha e um viagra. Tudo que o cidadão tinha a declarar era um atestado médico dizendo que poderia usar o comprimidinho azulado.

– Fruto dessa medicina moderna. Disse seu Agenor, 99 anos, e dono de um fogo que já lhe rendera até uns sopapos, por se meter com mulher alheia.

Pois foi numa dessas promoções que Frederico entrou de gaiato. Andando pela pracinha da cidade, numa manhã de sol, depois de ter dado assistência às suas oito ex-mulheres, e já se preparando para voltar para casa, que viu a menina Valeriana. Moça de corpo “caliente”, bem desenhado, cabelos lisos e compridos, cintura fina e rosto perfeito. Valeriana quando andava na rua não tinha um marmanjo que não olhasse. Até Clóvis, o gay que trabalhava na padaria, dava sua olhadela e o seu comentário.

– Aaaaaaaaaai, que inveja!

– Sossega bicha. Falava um coleguinha menos afoito.

A menina estava com dezoito aninhos e pelo que consta era noiva de Walter Arquimedes. Moço distinto, de muita decência. Trabalhava como mecânico e sonhava em ter a sua própria oficina. Deveria ter seus dois metros de altura e um corpo malhado pela labuta. De tão grande, só andava de moto. Era doido por Valeriana, a moça nova e que agora estava na lábia do velho Frederico.

Numa passada de braço pela cintura e uma frase no pé do ouvido a noivinha estava deitada com ele no SEX-agenário. Já lá pela quarta hora quando a promoção azul ia entrar em cena, Frederico ouviu um barulho estridente na porta. Saiu de cima da ex-virgem e olhou para a porta. Viu o mecânico grandão parado, já com metade do corpo dentro do quarto. Ele viu o velho, olhou de cima a baixo e caiu duro.

– Valha-me Deus, Arquimedes morreu! Gritou Valeriana.

– Será?! Perguntou o velho Frederico.

Disse isso e também caiu de lado. Tinha tomado dois remedinhos e o sangue fervia nas veias. Com o susto, a bomba do coração não aguentou e disparou. O Velho teve um treco ali mesmo. Foi tão rápido e intenso que a peia dele não deu tempo de baixar. Foi isso que alucinou o mecânico, prendia as mulheres, deu fama ao velho e deixou o cortejo ser acompanhado por toda a cidade. Dizem que o caixão fora adaptado para que o membro do velho não ficasse exposto.

– Será?! Quis saber um visitante à cidade.

– Vai lá ver. Só não dá pra testar mais.

VALBER DINIZ
Enviado por VALBER DINIZ em 13/09/2012
Reeditado em 18/06/2018
Código do texto: T3880060
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