O assistente…administrativo…

Imaginemos um mundo diferente, mesmo no futuro...imaginemos este mundo:

Crónicas de um tempo que há-de vir…

Do alto da sua torre de vidro ele contemplava tudo o que o rodeava, toda a imensa cidade onde todo o seu mundo pessoal e profissional se juntavam e acabavam por ser um só…

Houve um tempo em que este mundo era diferente, possuindo diferentes pessoas, com diferentes profissões, até que alguém chegou à conclusão de que o homogéneo social e profissional deveria primar sobre o heterogéneo, porque assim se aumentava a eficácia e assim se evitavam os conflitos que surgem sempre do encaixe possível das diferenças umas nas outras…

Havia assim cidades só de operários e fabricas, havia assim só cidades de minas e de mineiros, havia assim só cidades de arquitectos, enfim, havia assim tantas cidades como a diversidade humana é capaz de gerar…

E era assim que ele estava no alto da maior torre da cidade dos homens que faziam da vida dos papéis, da sua elaboração, a sua vida.

Em tempos tinham chamado a estes homens e mulheres “Assistentes Administrativos”, mas esses tempos tinham passado, e eles eram simplesmente números de uma cidade que tinha um número, um código, que no grande mapa impessoal das cidades do mundo mostrava qual a sua função, qual o seu lugar na sociedade e no mundo.

E ele era o chefe da sua secção, e por isso estava na torre a observar os seus subordinados, até aonde a vista alcançasse ou até onde a tecnologia permitisse ver, ou seja por todo o lado…

Ele observava, enternecido, os estagiários, lembrando-se do tempo passado em que fora também ele estagiário, ele observava estes a servirem de forma algo improvisada de estafetas, enquanto serviam também um café aos colegas, tanto por função informal, como por comodismo desses colegas…Um estagiário que com a perspectiva de ser mais do que um estafeta ou um rapaz do café dispunha-se a tudo, inclusivamente ao atendimento de telefones quando quem de direito não o podia fazer, no centro de cópias quando o trabalho era tanto que tinham que requisitar quem podia ser solicitado sem perturbar o seu trabalho…A única parte deste trabalho de “fundo da pirâmide” que era mais informal, e por isso mais interessante, era a possibilidade de também ser relações públicas de improviso e assim atender e encaminhar clientes que tinham perdido o guia ou simplesmente tinham aparecido fora do horário estabelecido, lá estando ele, o suposto elo mais fraco para salvar o dia…

Ele observava a categoria seguinte, onde os estagiários tinham deixado de unir as diferentes secções dos escritórios entregando correspondência interna, tinham deixado de servir de agente físico de união desses escritórios com outros e outras cidades, para passarem a estar numa secretária onde lhes era atribuída a incumbência de elaborarem documentos menores, mas tal não deixava de ser um promoção, e passar o rascunho do chefe para o transformar numa convocatória, num oficio e demais documentos do tipo não deixava de ser de facto uma promoção, enquanto pediam uma cópia, um café ao estagiário que tinha ocupado o lugar que o novo assistente tinha deixado vago…Ali ele sentia-se realmente alguém porque era visível, o seu trabalho ficava registado e não apenas na mente de quem via um estafeta a correr de um lado para o outro, que apesar de ter funções bem especificas não deixava de parecer, a um observador mais desatento, alguém que estava perdido e que andava de um lado para o outro à procura desse sentido, embora o que um estafeta fizesse tivesse todo o sentido…

Depois viria outra função, viria uma promoção para os mais aptos, mas para tal era preciso mudar de cidade, era preciso mudar de narrador, e era preciso contar uma outra história…

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 06/09/2012
Código do texto: T3868336
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