Agatha

Deitada na cama confortável, Agatha encarava o dossel enquanto cravava as unhas no colchão. A dor a consumir por dentro, se alastrando do estômago aos pulmões como fogo. Seu rosto estava impassível, tanto que já estava acostumada com a aflição. Suas lágrimas já secaram e não adiantavam de nada; seus soluços tornavam-se abafados pelas crises de tosse e seus gritos eram agora irrelevantes, já que sua voz estava rouca.

Só a restava tomar os remédios na hora certa, para não ficar inconsciente e desmaiar de dor, sem o auxílio de ninguém. Tinha 66 anos e toda a sua família já não existia, resultado de um acidente de explosão de gás que matara a todos. Agatha fora a única sobrevivente. Seu rosto, outrora tão belo e intimidador, agora estava cheio de cicatrizes e deformado pelo fogo.

Agatha enfrentava um câncer de estômago e um câncer de pulmão, proveniente de uma vida regada pelo fumo.

A quimioterapia não poderia tratar os dois tumores, apenas um. Agatha optou por não tratar nenhum, e estava aprendendo a conviver com a dor.

Em sua cama, fazendo uma força descomunal, só tinha forças para ir ao banheiro uma vez por dia e meter-se em uma banheira de água quente e tomar uma sopa fria e viscosa.

Agatha respirava fazendo barulho: a cada lufada de ar que inspirava, um buraco parecia ser aberto em seu peito.

O crepúsculo agora caía. Agatha ouviu alguém cantando uma música triste ao longe.

Bateram na porta. Agatha sobressaltou-se, surpreendida.

Uma mulher vestida de branco entrou.

– Olá, Agatha! Como tem passado hoje?

Mesmo não sabendo quem era a mulher ou o que ela estava fazendo ali, Agatha respondeu.

– Já tomei meus remédios hoje. Estou com uma dor insuportável. Acho que vou morrer em breve.

A mulher gesticulou negativamente com a cabeça e anotou algo na prancheta que carregava.

– Essa não, Agatha. Estávamos indo tão bem na semana passada.

Agatha piscou, confusa.

– Do que você está falan… AARGH! – nesse momento, sentiu uma dor aguda no estômago, como se repuxassem seus órgãos por dentro.

– Dê-me algum remédio, tire-me dessa aflição!

A mulher fez uma expressão decepcionada.

– Sinceramente, Agatha…

– Por que você não faz nada? Sua vagabunda miserável, sua…

– Agora já chega! – exclamou a mulher, eficiente – Agatha – recomeçou ela, em tom mais brando – não tem dor nenhuma.

Ao ouvir aquelas palavras, algo dentro de Agatha aquietou-se.

– Não tem dor nenhuma, Agatha.

– Não tem dor… nenhuma? – repetiu Agatha.

– Não.

A dor dentro de Agatha cessou como mágica.

– Mas como isso é possível?

– Você não tem câncer, Agatha.

Agatha enfureceu-se.

– Ora, mas é claro que tenho! Então como você explica as dores…

– Onde você está agora? – perguntou a mulher, interrompendo-a.

– Estou em casa.

– Não, Agatha. Você está em um hospital. Em um hospital psiquiátrico. Eu sou a sua doutora. Olhe.

A mulher apresentou um crachá onde dizia: “Dra. Julia – Psiquiatra”.

A mente de Agatha entrou em colapso.

– Em um hospício? Por que eu estou aqui? O que fizeram comigo?

– Você fez, Agatha.

Agatha a encarou.

– Eu fiz?

– Sim. Você matou a sua família em um incêndio criminoso cinco anos atrás. Todos morreram, exceto você. Você apresentou um caráter psicótico intercalando com o esquizofrênico e a perda de memória. Desde então, está internada aqui sob intenso tratamento e medicação…

Agatha gritou.

Um grito longo e interminável que ecoou pelas paredes do hospital, e que continuaria se repetindo por anos e anos.

Lucas Leonel
Enviado por Lucas Leonel em 26/08/2012
Reeditado em 26/08/2012
Código do texto: T3849774
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