Ilusão, doce ilusão.

Um dia acordei e vi que o sonho acabara. Simples assim, havia passado e eu simplesmente sabia disso.

Aquele fora, sem sombra de duvida, o melhor tempo da minha vida. Vivera momentos inesquecíveis e insubstituíveis, mas esse tempo havia passado. Eu simplesmente descobri que era hora de iniciar um novo capítulo da minha vida. A questão, contudo, era: eu conseguiria esquecer tudo aquilo, deixar pra trás e simplesmente seguir em frente?

Era hora de me testar: mesmo sabendo que a convivência com o meu passado me fazia mal, era tão bom revivê-lo a cada momento, relembrá-lo a cada ação, enxergá-lo em cada lugar, em cada rosto conhecido.

Meu vício naquele mundo me tornara entorpecido; eu necessitava de tudo aquilo e sabia que me fazia mal, mas não me importava.

Mas, dessa vez eu realmente queria deixar isso de lado e continuar. Era hora de deixá-lo para trás, de esquecê-lo. E foi isso que fiz, ou pelo menos tentei. Funcionou, é claro; por um tempo.

Naquela manhã, enquanto comia as torradas, resolvi não comer a geleia de jabuticaba, que era um lembrete da minha vida de outrora. Resolvi comê-las puras, com café preto, sem leite.

Foi o primeiro passo.

Fiz todo o caminho para o trabalho por um percurso diferente também. E decidi que precisava de um novo emprego. Isso seria bom.

Chegando ao escritório, fui para a minha mesa, fiz tudo o que tinha a ser feito, me concentrando somente naquilo, já que o mundo exterior já não mais existia.

No almoço, fui comer comida chinesa, coisa que eu detestava, mas que teria que aprender a conviver, para quebrar a rotina.

Novamente no escritório, me deparei com mais uma pilha de papéis a serem lidos e problemas para resolver: eu estava no paraíso da distração.

O clima no escritório transcorreu como de sempre o dia todo: as únicas conversas eram as necessárias para resolver os assuntos do trabalho, o café da tarde era o mais impessoal possível, os olhares eram mortos, sem ânimo nem o mínimo de calor e o ambiente mais parecia um cenário de Macbeth.

Isso só fazia reforçar minha teoria: eu precisava sair dali o mais rápido possível.

Ao fim da tarde, passei em uma banca de jornais, comprei um tabloide só com anúncios de empregos, que sabe encontrasse algo de útil ali.

Voltando para casa, comprei uma sopa instantânea para comer mais tarde e fui direto para casa.

O hall me esperava como sempre organizado. Coloquei minha jaqueta no cabide e fui para a cozinha. Lá abri um vinho, peguei uma taça e fui para a sala ver um pouco de TV.

Fiquei até tarde vendo Discovery, pelo que me lembro, já que lá pelas tantas adormeci e só acordei de madrugadinha.

É, meu caro, eu sobrevivera a mais um dia. Isso era, sem dúvidas, uma conquista. Passara o dia todo sem pensar em coisas indesejáveis, ou pelo menos evitando-as. Quando tudo explodisse eu sabia que não seria nada agradável, mas deixemos o depois para um dia em que eu não sobrevivesse. Nesse dia, eu não iria querer estar na minha pele.

João Carlos

28/07/12 - 02:08