Uma vida Norma.

Estou do lado de fora da gaiola hoje, mas amanhã será um novo dia. Logo farei as mesmas coisas da semana inteira e sexta vai ser dia da faxina geral. A diversão de fato é o trabalho, porque ocupa minha mente. O tédio já é a minha condição normal.

Minha mãe me mostrou que a pior prisão é aquela em que nós mesmos nos submetemos e as circunstâncias que a vida meu deu, me levou à esse amargo caminho. Sempre dizem que temos que seguir nossos sonhos e nunca desistir deles quando jovens, mas o mundo é difícil de viver, o mundo é injusto e essa história não é de todo verdadeira. Imaginemos uma pessoa que nasceu na rua, passando no vestibular para medicina. Dá para entender? Acredito que possa um dia acontecer, mas já ouvi minha patroa falando algo em que me identifiquei. Ela contou sobre um homem e seus pensamentos, dizendo que somos todos produtos do meio. Sou uma prova viva dessa afirmação!

Nasci no Rio Grande do Norte, e tenho uma história muito banal. Meu pai se separou da minha mãe quando eu tinha dez anos, eu era a filha do meio, dentre 7 filhos. Fui com meu pai para Fortaleza.

Cuidei de 3 dos meus irmãos, vivendo de casa para o colégio. Com meus dezesseis anos meu pai não me deixou mais ir para a escola. Queria que eu fosse trabalhar para ajudar em casa e que procurasse um marido breve. Nesse tédio passei a frequentar a Igreja. Lá conheci um rapaz chamado Pedro. Logo conheci o lado realmente amargo da vida.

Meu pai era muito ciumento, apanhei muito por causa do namoro. O tempo foi passando, mesmo trancada em casa conseguia vê-lo. Meu pai acabou por afrouxar para nós e logo depois consentiu de nos casarmos.

Fui casada doze anos e tive três filhos. Ele me batia, tinha outras mulheres e eu aguentava aquilo tudo por meus filhos. Em um belo dia ele chegou para pegar suas coisas e se despedir dos filhos. Como sobreviver de faxina e sustentar dois filhos? (...)

Hoje todos estão casados, um mora em Recife, outros dois aqui mesmo em Fortaleza. Meu marido me deixou no meio do caminho, me fez sofrer bastante, foi muito difícil formar essas pessoas tão especiais e de caráter afinco no meio de condições tão difíceis, sendo mãe solteira, sofrendo preconceito chegando à ser maior que ser apenas negra.

Agora moro no um apartamento dos meus patrões. Trabalho os 6 dias da semana. Meu quartinho não cabe muita coisa, mas seu tamanho não é o problema. O problema é a solidão que é me passada pelas distância entre as paredes. O tamanho do cubículo aperta a amargura que trago no peito. Penso em todas as horas do meu trabalho, cada gota de suor, e aonde fui parar. Estacionar terminantemente nesse cômodo em que me assombram as memórias, as mágoas e as decepções.

O único motivo de ainda me manter viva, de esboçar o sorriso manso que tenho e ver que tudo valeu a pena, são fotos dos meus filhos, que tiveram caminhos diferentes do meu, se tornando meu único consolo. Vê-los todo final de semana, nos reunirmos e rir bastante, conversar bastante. É ter a família que muitos que têm condições de ter, mas poucos aproveitam. Agora só me resta esperar o dia em que Deus pegue na minha mão e leve. Que de solidão e melancolia já me basta faz tempo.

Ak
Enviado por Ak em 12/07/2012
Reeditado em 04/01/2013
Código do texto: T3774442
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