RECORDAÇÕES DE INVERNO DE UM VELHO PROFESSOR

Um frio intenso cortava aquelas tardes de inverno, que a anos não era tão rigoroso como estava sendo. O vento assobiava canções entre as árvores passando por elas como um grande maestro de uma sinfonia. Ali no banco da praça olhava tudo identificando em cada detalhe o que lhe restara ainda na memória que pouco a pouco o tempo estava enfraquecendo. Por longe pareceu-lhe ouvir uns sons familiares. Vozes que buscadas no seu baú de lembranças interior lhe eram bem conhecidas. O frio já não lhe parecia tão intenso mais e algo dentro dele começou a bater mais forte, como se um novo sopro de vida tivesse sido lançado para dentro de si. Sentia os pingos de orvalho gelado que lhe caiam nas costas, no entanto, se antes os pingos lhe queimavam pelo frio que estava, agora pareciam gotas de perfume a juntar-se aos perfumes das flores que circundavam toda a praça. Aos poucos as luzes do dia vão se apagando. Inicialmente em todos de vermelho, depois em dourado e finalmente o negro invade tudo. E ele permanecia ali, sentado, observando tudo e ouvindo aquelas vozes que lhe pareciam tão conhecidas. Animadas ora riam, ora cantavam, no entanto via-se claramente em todos os momentos que estavam felizes. Se levantou devagar. O peso da idade já mostrava um sobrepeso em suas costas, arqueadas com tantos invernos que já tinha vivido. Mas permanecia o verão dentro de si. Sentia que aquelas vozes de alguma forma lhe trazia lembranças felizes, de momentos que talvez não pudesse precisar quando aconteceram, mas que tinha certeza de que eram muito importantes em sua vida. Deu alguns passos a frente, dobrou a direita, e mais alguns passos. Parou e não pode conter as lágrimas nos olhos. Lagrimas de felicidades banhadas pela lembrança do passado que já era remoto. Do outro lado da praça vozes alegres vinham de uma escola onde crianças ensaiavam para uma daquelas quadrilhas que sempre acontecem em festas juninas, marcando o inverno com muita alegria e descontração. Vozes lindas, suaves, com sorrisos que podia se entrever mesmo com o muro da escola separando ele daquelas vozes. E alegre sorriu. Lembrou-se de quando ainda jovem, era professor naquela mesma escola e por anos a fio cabia a ele “gritar” a quadrilha do inverno. Sorriu para si mesmo, e pode ver, cada um dos seus ex-alunos nos passos animados da dança típica ou com os trajes juninos coloridos e as vezes exagerados. E contente pode perceber que em décadas de trabalho ele sempre contribuiu para que a manutenção da vida da cidade fosse garantida. Eram as vozes da alegria, da felicidade pulsante, e ele se sentiu realizado porque ele também fazia parte daquela vida. E num sorriso de quem está de bem com a vida, sussurrou baixinho: Olha a cobra..... é mentira..... E seguiu em direção a sua casa.