RELAÇÕES
Lucio decidiu tentar mais uma vez. Há tempos, o relacionamento com a filha Perla, de 15 anos, não vinha bem. Brigas, discussões, desobediências... Sua esposa, Vilma, sofria com a situação, mas estranhamente não agia, vivia a situação em silencio.
Naquela madrugada, a filha tinha passado dos limites, Lucio atendeu um telefonema as três meia da manhã, com a informação que ela estava bêbada, na saída de mais uma das festas que sempre ia com amigos.
Foi buscar a filha e decidiu tentar mais uma vez. E ainda no carro tentou:
- Filha, o que está acontecendo?
- Nada!
- Como? Nada?
- Estou curtindo?
- Curtindo? Você está se matando?
- Que bom!
- Que bom?
- É... Que bom!
- E sua mãe?
- Não me fale desta...
- Olha, como fala da sua mãe...
- Não sei como o senhor agüenta...
- Que isso Perla... Ela está sofrendo...
- Já te pedi pra não falar.
- Cale a boca!
- Calar a boca! Seu... Seu... Babaca!
Lucio parou o carro e deu uma bofetada na filha. Ela levou uma das mãos no rosto e gritou:
- O senhor quer saber por que a vida é uma merda? Por que estou vivendo do meu jeito?
- Fale sua cretina! Fale... Você tem tudo, boa escola, boa família, tem o seu quarto... Tudo!
- Boa família papai?
- Sim... Pais casados há vinte anos! Numa sociedade em que a maioria dos seus colegas convive com pais separados!
- Casados?
- Sim! Casados!
- Pois bem papai, eu peguei a mamãe entrando num motel com o Silas...
Lucio arregalou os olhos e perdeu a fala...
- Sim papai, eu vi ninguém me falou. Aquela santa senhora que o senhor defende, aos beijos e abraços com o Silas, nosso vizinho. O senhor estava viajando, eu fui ao Centro e vi os dois num carro. Demorei a acreditar que era ela. Segui os dois e vi quando entraram num motel. Guardei em silencio. Um silencio que está me matando... Me matando!
Lucio ouviu. Em silencio. Sentiu uma dor esquisita. Era o seu mundo que desabava aos poucos.