Tarde chuvosa e fria.
          Uma xícara de chá em uma mão ... livro na outra ... senti o coração apertado, uma tristeza anônima!
          Soa o interfone, atendo e uma voz frágil diz:
     - É você que é Teóloga Espírita? Pode me ajudar?
     - Ajudar? No que posso ajudar?
     - Meu filho ... ele morreu ... tinha só 17 anos ...
     Fiquei atônita, tentando conciliar os pensamentos.
     - Espere, vou descer ...
     Semblante pálido, me olhando fixamente. Mãos agarradas ao portão como se agarrassem a mim. Os olhos ... olhos que pediam ...
     Tentando sorrir, disse-lhe:
     - Boa tarde! Qual o seu nome?
     - Elisa e meu filho é Rafael!
     - Quem lhe falou de mim, Elisa?
     - A moça da Panificadora ...
     São várias e nem lembrava de ter falado que sou graduada em Teologia com alguma delas ...
     - E você quer conversar, Elisa? Sobre teu filho?
     - Quero sim! Quero que você fale com ele, pra eu saber como ele está, se está bem ... Diz pra ele que sinto muita falta ...
     A pobre mãe começou a chorar, cobrindo o rosto com um lenço branco ... as mãos arroxeadas pelo frio e chuva.
     Em cidades grandes, onde notícia de violência é assunto corriqueiro, não se costuma convidar à casa um estranho, mas naquela situação, convidei-a a subir ao meu apartamento.
     Sentada à mesa da cozinha, servi-lhe uma xícara de chá. Aqueles olhos ... eram a dor transfigurada! De um azul pálido, pedindo, rogando ... me inundavam a alma de dor compartilhada.
     Tentei explicar que Teologia Espírita é uma graduação de Ensino Superior e que não produz “médiuns” de nenhum tipo, assim sendo, não poderia ajudá-la.
     - Compreende, Elisa? Eu não me comunico com Espíritos desencarnados, e mesmo quem possa fazê-lo, não há garantia que a comunicação se efetive.
     Seus olhos, aqueles olhos que suplicavam ... se apagaram ...
     - Seu filho ... me fale um pouco dele. Quando ele faleceu?
     Elisa já não me olhava mais, apenas para a xícara de chá ...
     - Faz um mês hoje. Tinha leucemia.
     Um mal estar me atingiu, pois há muito tempo pretendo ser doadora de medula, mas ainda não me submetera aos testes ... Adiamentos ... procrastinação ... Se fosse já uma doadora, ele estaria vivo? Minha medula seria compatível?
     A culpa ... sempre a culpa ... e aquele olhar ... aquela mãe destruída, sem a alma ...
     Respirei fundo, rogando silenciosamente por ajuda, continuei:
     - Me fale um pouco dele ... do que ele gostava? Ele ia à escola?
     Elisa mudou a postura, como se um pouco de luz a tocasse ... e passou a falar de Rafael, do que gostava, dos amigos que tinha, de como era bom aluno ...
     Ficou em silêncio por um minuto e me olhou, dizendo:
     - Engravidei para aumentar as chances de compatibilidade, sabe? Um irmão pode vir a ser doador compatível ...
     Nem notara que Elisa estava grávida. Tão magra!
     - Quantos meses de gestação?
     - Quatro. Não consegui engravidar antes. Não deu tempo ...
   





 
                             ... continua ...








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SIMONE SIMON PAZ
Enviado por SIMONE SIMON PAZ em 19/06/2012
Reeditado em 19/06/2012
Código do texto: T3732957
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