A MALA

SÉRIE CONTOS URBANOS I

A MALA

- Estamos quase chegando a Aracaju meu bem calce os sapatos!

- Tá bom! Você sabe mesmo do endereço da casa de Firmina?

- Sei meu bem. Rua Bahia 79.

- Então está tudo bem. Num quero é ficar rodando a cidade à toa.

- Não se preocupe chegaremos à casa de tia Firmina em paz.

O ônibus estava lotado. Era o último que vinha de Tobias com destino a Aracaju. O casal tobiense estava visitando um parente doente na capital sergipana. Os dias e noites estavam muito quentes em Aracaju. Não ventava e as pessoas reclamavam do calor.

- Meu amor Aracaju é quente, né?

- Num é o que!

- É quente mesmo! Olha a rodoviária!

Sidinei levantou a cabeça da cadeira e ajeitou os óculos de lentes grossas.

- É grande, né?

Sair do Jacaré direto para a Aracaju foi a experiência do casal que veio socorrer a tia que estava para se operar de câncer. Eles não sabiam muito sobre Dona Firmina. O que estava acertado era Tereza dar o amparo à mulher após a operação. O resguardo não seria longo, esperavam eles, pois, hoje em dia, é tudo ligeiro.

- Meu bem quando tia vê a gente ela vai recobrar coragem.

- É, mas deixamos os bichos tudo na mão dos outros. E sei lá num que vai dar essa história.

O casal desceu do ônibus e foi direto para o ponto de taxi. Um taxista de meia idade se aproximou dos dois e disse: “Vão querer um taxi?” “Vocês vão para onde?” Eles disseram que iam para Rua Bahia. O motorista partiu para a Avenida Oswaldo.

- Demora muito moço?

- Não. Indo por aqui é rápido. Artíles era um motorista competente e honesto, pelo menos, a maioria das pessoas comentava isso. Ele foi o homem que encontrou uma bolsa cheia de euros no banco do passageiro de seu carro e devolveu. Artíles era um brasileiro honesto até que se prove o contrário.

- Meu amor num queres comprar nada não?

- Moço quando passares por uma padaria pare que eu quero comprar pão.

- Tudo certo amigo.

O taxi parou e Sidinei desceu para comprar pão e outras coisas. Não demorou muito. O motorista do taxi se vira para o casal e pergunta: “Onde é mesmo?” “Na Rua Bahia”, Respondeu os dois em coro.

- Sidinei, ela disse que se ela não tivesse em casa, a chave estaria no vaso de comigo ninguém pode perto do portão.

- Psiu! Sua idiota! Como é que você diz uma coisa dessas?

- Desculpe Sidinei, é o costume! Terezinha, ou Nininha como muitos a chamavam falou baixinho. O taxi entrou na Rua Bahia pela Rua Alagoas. Dobrou a direita e subiu a rua. O casal estava ansioso para conhecer a casa da parenta. A Rua Bahia, muito conhecida em Aracaju, estava escura. Não havia ninguém nas calçadas. Esse costume está morrendo no Siqueira. Antigamente, o hábito era por as cadeiras na porta, conversar e tomar uma fresca.

- Qual é o número mesmo? Perguntou Artíles.

- É 79. Depois de subir e dá ré a procura da casa, Artíles para o carro e diz:

- Num tem nenhum 79 não. Tem certeza que é 79?

- Tenho sim. Terezinha passa um papel de caderno com o endereço e o número da casa. Artíles o lê, desce do carro e sai a procura a pé. Finalmente, ele encontra a casa. Estava tudo fechado. Sidinei pega a chave no caqueiro e abre o portão depois a porta. Ali mesmo, eles pagam o taxista e se despedem. O interior da casa era sereno. Após acenderem a luz o casal sentiu que estava em casa. Ligaram a televisão. Estava passando o jornal.

- Meu bem!

- Sim!

- Tá com fome?

- É claro né Tereza!

- Não precisa ser ignorante.

O casal passou a noite. A manhã veio animada. Os dois foram à feirinha do Siqueira fazer umas comprinhas. Voltaram antes das doze horas comeram e foram ver televisão.

- Tereza, num tá estranho não?

- Tá. Onde está minha tia?

- Num é? E a gente nem sabe para quem ligar. Firmina era uma mulher só. Depois que deixou o Jacaré amadureceu na selva de pedra. Sua parenta que restou foi Tereza. O casal não sabia que Firmina era rica. E nem imaginava como ela ficou assim.

- Meu amor corra aqui!

- Que foi mulher? Estou vendo televisão!

- Venha aqui rapaz! Sidinei foi. Tereza estava sentada na cama no quarto de empregada. Ao lado dela estava uma maleta de couro marrom legítimo. A mala tinha detalhes em ouro. Dentro dela ouro, dólares, e francos. Joias e diamantes completavam o pequeno tesouro. Tereza a encontrou em uma caixa debaixo da cama. Tereza e Sidinei eram agricultores no Povoado Jacaré em Tobias Barreto. Foi a primeira vez que eles viram aquilo – o dinheiro estrangeiro e as joias e pedras brilhantes.

- Rapaz Firmina é cheia da grana!

- Como foi que ela ficou rica?

- Sei não.

O casal ficou na casa a espera da tia quinze longos dias. Todos os dias, Sidinei pegava naquelas pedras. Depois as guardava no mesmo lugar.

- Tereza, já pensou se a gente levasse a mala? Ela não ia saber. Ninguém viu a gente aqui!

- A vizinhança viu besta! Mesmo assim nós somos gente honesta.

- Estou só brincando com você!

O casal se cansou de esperar. Firmina não apareceu nem mandou recado. Era muito estranho, a tia desaparecer. Os dois decidiram retornar para Tobias e aguardar sinal da tia. Uma carta, um telefonema. Sidinei e Tereza voltam para o Jacaré.

- Tereza, a gente com aquele dinheiro. Já pensou?

- Rapaz você tá pecando!

Um mês passou muito rápido. E nada de Firmina dá sinal de vida. Ninguém sabia de seu paradeiro. Tereza apenas sabia que sua tia ia se operar por causa de um câncer. Aquilo era muito estranho. O casal decidiu voltar a Aracaju.

- Meu bem, vamos mexer nos papéis dela para ver se a gente acha algum endereço, alguma coisa para a gente começar a procurar?

- Sim. Deus vai nos ajudar! Mas, que está estranho está. O casal do Jacaré encontrou a chave no mesmo lugar. A casa estava no mesmo lugar. Ou seja, Parecia que ninguém havia entrado ali. Uma pegada, um cigarro acesso, nada. Definitivamente, Firmina não havia estado ali. Ninguém havia estado ali. Sidinei vai ao quarto de empregados em busca da mala de couro. O rapaz deu um grito de susto quando meteu a mão na caixa debaixo da cama e nada encontrou. Sim, a mala sumiu. O dinheiro também.

- Tereza. A mala sumiu! Bem que eu disse para levarmos conosco! E agora vão pensar que foi a gente!

- Vamos embora logo!

- Mas agora não tem ônibus.

- Então vamos amanhã de manhã.

O casal se preparava para se deitar. Tereza usou o banheiro e foi por o lixeiro no quintal. Acendeu a luz; caminhou uns dois metros na direção do muro dos fundos. Havia cimento até a metade da área do quintal. O resto eram plantas e grama. O vaso de metal para o lixo estava no pé do muro. Ao seu lado sobre um monte de areia, um gato cavou o chão. Tereza viu o gato e foi até ele. O gato percebeu e fugiu deixando um dedo humano sobre areia. Tereza deu um grito abafado. Sidinei foi ao encontro.

A visão do cadáver de Firmina chocou a ambos. Primeiro o dinheiro, depois um corpo enterrado. Roubo e homicídio. Eles, agora, estavam em maus lençóis. Enquanto os dois decidem sobre o que fazer, se chama a polícia ou não, o telefone toca: “Alô, sim!” “Aqui e do serviço de taxi. Vocês pediram um taxi?” “Não!” “Então foi um engano”. A voz do homem, segundo Tereza, era conhecida, mas, ela não recordava de quem. O casal foi para Tobias no outro dia.

Uma semana depois, o jornal anuncia que acharam um cadáver no Siqueira. A polícia investigou o caso. Três meses depois, o casal foi preso por roubo e homicídio. Artíles comprou uma frota de taxi. O homem ficou rico. Parece que Deus o recompensara por todo o serviço prestado naquele automóvel. O casal foi condenado por assassinato premeditado seguido de roubo e ocultação de cadáver. A sentença para ambos foi 17 anos de reclusão em regime fechado, no entanto, isso não aconteceu, pois eles passaram para o regime semiaberto em pouco tempo, depois eles ficaram livres. Foram apenas seis anos e meio de cadeia. Eles eram réus primários. Com saída da cadeia, o casal vendeu tudo e foi para a Bahia. Ninguém sabe onde eles moram atualmente, assim como eles não sabem quem pegou a mala e matou Firmina. A chave da casa de Firmina continua no caqueiro. De vez em quando as pessoas veem um taxi parado na porta...

Roosevelt leite
Enviado por Roosevelt leite em 15/06/2012
Reeditado em 26/06/2012
Código do texto: T3725424
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