Da série Supermercado: O Juízo Final
O juízo final
Fui com meu marido ao supermercado, pois essa façanha ainda não consegui realizar sozinha; peguei o carrinho para acompanhar entediada o meu marido pesquisando preços e comprando coisas com a dita listinha na mão (falei sobre ela em outra oportunidade).
Como minha imaginação é um pouco fértil, enquanto empurrava o carrinho ficava pensando em minha humilde função naquele momento:
1-Mulher quebradora de paradigmas;
2-Estava lá para aumentar o fluxo de pessoas;
3-Bibelô empurrando carrinho;
4-Papai Noel no trenó depois de um dia puxado;
5-Dando uma de entendida
Rindo de nada e sozinha, só parei quando as pessoas me olharam. Como meu marido já está acostumado, fui encontrá-lo muitas gôndolas adiante com as bochechas vermelhas. Será que ele tem vergonha de mim? Fui lá perguntar, ao que ele respondeu negativamente e que o enrubescimento se devia a uma corrente de ar. Não acreditei e então fiquei com os olhos bem abertos na direção dele e qualquer olhadinha diferente seria motivo para largar o carrinho, derrubá-lo (se conseguisse), chutá-lo e cuspir nele. Depois pensei que alguém poderia pisar no fruto do meu ódio e cair, então descartei essa possibilidade.
Seguindo adiante e de olho nele, logo perdi o foco e fiquei pensando sobre as pessoas que estavam lá dentro comprando, empurrando, pesando, pagando e o que era mais incrível: elas estavam felizes! E eu estava nervosa como sempre.
Isso me fez lembrar sobre o Juízo Final e os quatro cavaleiros do Apocalipse: Quando entramos no mercado temos a plena convicção de que oprimiremos as compras em nosso carrinho e vitoriosos em nossos cavalos brancos conquistaremos o que nos falta na geladeira.
Seguindo de pertinho está o segundo cavaleiro com seu imponente cavalo vermelho guerreando em busca de preços mais baixos e pequenas confusões com a gerência.
E se o caldo engrossar é muito possível que vamos embora sem o rancho e sem a chance de encontrar outro mercado aberto e eis que surge nosso terceiro cavaleiro montado no seu cavalo preto de fome.
Chegaremos em casa com tanta fome que praguejaremos contra todos os supermercados do universo, e estaremos montados em nossos cavalos pálido-descorado tendo às mãos um garfo e uma faca de serrinha.
Mas eis que raia um novo dia e vamos às compras matando nossa fome, nossa boca suja e também nossa impertinência em brigar com o gerente do mercado.
Quando dei por mim, meu marido já estava empurrando o carrinho em direção ao caixa e eu toda eufórica contando a ele minhas divagações com a exceção de que eu não me lembrava de dois dos quatro cavaleiros. Depois me lembrei que ele tinha ficado vermelho logo no início das compras e disparei, bem grosseiramente alías:
"Você não me disse direito se estava com vergonha ou não de mim... "
"E você me pergunte de novo quem são as quatro bestas do Apocalipse." Me disse ele sem respirar.
É o juízo final mesmo!