AMORES BRUTOS
Claudia tinha a mania de se apaixonar sempre por homens brutos. Jamais, em toda a sua vida, havia namorado um cara gentil, que abrisse a porta do carro, que enviasse flores em datas especiais. Nada disto. Seus maiores amores haviam sido uns brutos, bárbaros, destes que davam a impressão de terem saído da pré-história diretamente para o século 21. Mas de todos os seus amores brutos, o que mais tinha passado rápido pela sua vida tinha sido o Valadão. O nome parecia dizer tudo.
A primeira vez que Claudia e Valadão se encontraram foi na praia. Era janeiro, férias, calor. Ela passava alguns dias na casa da avó, recuperando-se de um ex amor, um brutamontes que quebrara alguns pratos do enxoval do casamento da sua mãe, em uma briga fenomenal com Claudia. O rapaz saíra da casa dela escoltado pela polícia e, para se curar da sua dor e do vexame assistido pela vizinhança, a jovem foi parar na praia, na casa da avó. E lá se deparara com o Valadão, um ser de quase dois metros de altura, moreno do sol, olhos verdes, semelhante a um armário. Amor à primeira vista.
Ela, tipo mignon, frágil, cabelos loiros compridos, fazia o tipo certo do Valadão. Quando a viu da primeira vez, observando-o de cantinho na sua roda de pagode, Valadão se perdeu. Errou a letra da música (felizmente parece que ninguém percebeu), quis aparecer mais que todo mundo para que ela visse o quanto ele era popular e quando percebeu que aquela garota parecia já estar na sua, enviou-lhe várias piscadinhas de olho e sorrisinhos de gato. Ela retribuiu.
No dia seguinte já estavam namorando. A avó de Claudia, D. Jurema, estava escandalizada com o comportamento da neta. Pela manhã chorava a perda do ex-namorado. De noite, chegava em casa e dizia que estava apaixonada. Era demais. Agora, estavam os dois ali, para participar do almoço de domingo. Um bárbaro de três metros de altura e que já se achava muito à vontade em uma casa que não era a sua.
Mas para surpresa de toda a família – inclusive de Claudia – o Valadão começou a revelar seu lado sensível e humano aos poucos. Primeiro, brincou com todos os primos da namorada, menores de quinze anos. Ajudou D. Jurema a preparar a salada e, ainda por cima, escutou atentamente o avô de Claudia contar sobre suas peripécias na juventude. Por fim, D. Jurema ficou encantada. Que menino amável! Tão grande e tão gentil. Até lavara a louça para ela. Sem dúvida, finalmente a neta arranjara um homem decente.
Mas Claudia assistia a tudo com um sorriso amarelo no rosto. Valadão era gentil demais, querido demais, tratava-a bem demais. Fazia de tudo para agradá-la, mimá-la, um gentleman. Claudia detestava cavalheirice. O que ela queria era um homem selvagem, que a agarrasse pelos cabelos e a sacudisse sem dó nem piedade. Quando o Valadão se sentou ao seu lado, comendo um doce de abóbora com coco e segurou gentilmente a mão dela, Claudia não se conteve e gritou na cara dele:
- Me sacode, Valadão! Me bate!
O namoro terminou naquela hora mesmo. Claudia fugiu para o quarto, envergonhada da sua falta de controle. Constrangido, Valadão nem terminou a sua sobremesa. Deu um beijo afetuoso em D. Jurema e foi embora. Desde então, Claudia assumiu de vez que o que gostava mesmo era de bárbaros, de cafajestes, de homens que falavam alto e arrotavam sem vergonha nenhuma de ninguém. Era isto. Claudia gostava de homens selvagens.