Luz na madrugada

Era mais uma fria madrugada deitado naquela calçada sob uma marquise de um prédio.

Não que Osvaldo já não estivesse acostumado a isto, afinal desde muito jovem vivia perambulando pelas ruas em busca de alimento e alguns trocados.

A baixa temperatura agredia seu sofrido corpo, desprovido de agasalhos adequados a intempérie desta época do ano.

Virando-se de lado, buscando de alguma forma se cobrir com os curtos trapos que utilizava para proteger-se, Osvaldo tinha como companhia na fria calçada mais alguns pobres indigentes que como ele lutavam pela sobrevivência, mesmo que sobreviver significasse prolongar o sofrimento de uma existência de privações.

O frio que amortecia as extremidades de seu corpo era muitas vezes amenizado por uma sopa quente que almas generosas lhe ofertavam em algumas frias madrugadas através de serviços assistenciais privados.

Eram estas pessoas que muitas vezes acabavam por comunicar as autoridades locais, que alguns destes sofridos cidadãos jaziam sem vida enrijecidos pela baixa temperatura que ceifara-lhes a vida.

Acostumado à triste sorte que lhe era imposta, Osvaldo não tinha como hábito reclamar da falta de coisas materiais, mas magoava-lhe acintosamente o desprezo e o pouco caso que lhe eram dirigidos por sua situação financeira.

Naquele dia desde cedo, ele não se sentira muito bem, com dores que lhe incomodavam e forte pressão no peito, que causava-lhe certa dificuldade em respirar.

Deitado de barriga para cima, para melhor se acomodar tentando diminuir o desconforto que estava sentindo, Osvaldo olhava fixamente para a luz acesa do poste de iluminação pública, que ficava sobre sua cabeça.

Como que uma mariposa hipnotizado pela luz que emanava do poste, ele notou que sua intensidade aumentara, transmitindo-lhe de alguma forma uma onda de calor que fazia com que se sentisse mais confortado e aquecido.

Com os olhos fixos, Osvaldo sem esboçar qualquer reação, observou a luz aumentar de tamanho e intensidade de calor, como se estivesse descendo ao seu encontro.

A sensação de bem estar era tamanha próxima aquela luz, que Osvaldo não sentiu qualquer receio ou preocupação com o fato até então, nunca presenciado por ele.

À medida que o facho de luz dele se aproximava, Osvaldo ia como que amortecendo seus sentidos e suas dores, que a pouco estavam estraçalhando seu peito desnutrido e mal agasalhado, esvaneciam como que por encanto.

Envolvido pelo calor reconfortante daquela luz, Osvaldo adormeceu tranqüilo, deixando para trás a vida sofrida de privações e sofrimentos, para enfim poder desfrutar de um pouco de consideração e sentimentos de irmandade e compaixão.

Seria mais uma manhã como outra qualquer naquela grande cidade, onde mais um ser rejeitado pela sociedade e largado a própria sorte, amanheceria sem vida em uma fria calçada, onde muitos pedestres que por ali circulavam nem notariam o que havia lhe acontecido.

Amanheceria mais um dia repleto de egoísmo e intolerância em uma sociedade mesquinha e violenta, mas não mais para Osvaldo, que teria daquela madrugada em diante, uma nova chance para evoluir e ser feliz.

A vida é um grande desafio, cheia de provações e obstáculos, que podem e devem ser amenizados com o calor humano e a compaixão para com o próximo.