CONTO – Nobre, uma lição de vida – Parte XX – Catolé o Rocha (PB)
 

CONTO - Nobre, uma lição de vida – Parte XX – Catolé do Rocha (PB) - 09.05.2012
           

 
          Arrumadinha a agência, restava agora cuidar na parte da rentabilidade, porquanto na administração passada o resultado era deficitário. O próprio gerente se mostrava desanimado, desinteressado, sem motivação para continuar à frente da filial. Sua vontade era ir embora para João Pessoa, ode encerraria sua carreira no banco, passando a gozar das delícias das praias maravilhosas de lá. Justo, naquela época (1973) o empregado do banco era tido como funcionário público, tanto fazia dar prejuízo como lucro, o governo cobria. A cultura era essa, a conta de movimento do BACEN era movimentada sem qualquer restrição.  
            Aliás, por falar em conta de movimento essa versatilidade com que o banco contava era um elemento facilitador do controle das taxas de juros no mercado. O BB seria o mesmo que um Banco Central. Quando a rede privada subia seus juros aí entrava o banco com linhas de crédito mais favorecidas, até porque sua finalidade sempre fora contribuir para o desenvolvimento do país, reduzir os desníveis regionais, mas já havia uma corrente que pugnava pelo encerramento da conta de que falamos linhas acima, notadamente o Bradesco. Pra reduzir taxas de juros não é necessária tanta celeuma como o governo fizera recentemente, inclusive na caderneta de poupança. Os culpados das gigantescas taxas praticadas no Brasil são apenas o Senador José Sarney e o ex-ministro Maílson da Nóbrega.

            O subgerente exercia uma grande liderança entre o funcionalismo, mas oriundo de agência de menor porte não sabia ainda de certos macetes que se nos apresentava a parte contábil do banco, o tratar com as rubricas de despesas e receitas da direção geral. Nobre resolvera pedir para examinar os seis últimos balanços semestrais – três anos --, a fim de visualizar as contas de despesas que apresentaram maior elevação nos períodos. Foi direto para a conta “Direção Geral – Despesas a Transferir”. Surpresa! Deu no que pensava. A filial deixara de debitar à direção geral pelos valores das gratificações semestrais pagas ao pessoal – antigamente essa verba competia à sede, isto é a agência pagava e, no balanço, fazia o ressarcimento a débito dela, inclusive dos encargos sociais.

            Nossa, que achado! Nem quis olhar balanços mais atrasados. Resolvera de chofre mandar fazer uma “partida” debitando DG e creditando “Receitas por Compensação”, conta de resultado, cujo montante já era suficiente para que se apresentasse um fabuloso lucro já no primeiro semestre de sua atuação. O Fernando ficara com medo da providência, mas se acalmou quando falei que iria rubricar o documento, dando-lhe autenticidade, comparecendo com minha responsabilidade. Já havia tomado tal medida em Bacabal, de onde viera. Não era novidade alguma.

            As duas usinas de beneficiamento de algodão que funcionavam na jurisdição estavam com problemas no banco. JP Dantas & Cia. Vinha trabalhando a duras penas, mas sem limites para desconto de suas duplicatas. Freitas Maia & Cia. Praticamente fechara suas portas, estava abandonada, as máquinas envelhecendo, sendo deterioradas pela rigidez do tempo. Submetida uma proposta de desconto à direção geral, em favor de J.P.Dantas, que tinha com o sócio majoritário o Dr. Pinheiro, o pleito fora deferido com a obrigatoriedade de se deduzir dez por cento dos valores descontados para amortização dos débitos junto ao banco, exigindo-se que só vendesse a empresas sadias, que honrassem seus compromissos em dia. A ALSECOSA, de Caicó, era uma firma espetacular, e passara a comprar algodão em pluma da firma do Dr. Pinheiro. Além do mais, ficava perto, a uns 80 km de Catolé do Rocha.

            Rosado Maia estava à frente de Freitas Maia & Cia. Corretor de algodão, morava em Recife, e isso dificultava qualquer contato com ele, mas nunca se recusara a conversara com o gerente. Sempre que havia uma “brechinha” ele viajava para entendimentos. Surgira a idéia de vender a empresa, mas o apurado não daria para liquidar a conta, tudo indicando que na hipótese de uma execução o banco teria de pedir a penhora de bens particulares dos dirigentes. Não seria bom negócio para eles, pois a família Maia era tradicional no Rio Grande do Norte e adjacências, seria humilhante, até porque o patriarca da família estava doente, não poderia tomar susto dessa natureza. Vender seria o melhor remédio, inclusive porque ainda se poderia contar com a assinatura do principal sócio, ainda sóbrio.

            Problema seria arranjar compradores. Quem sabe a Cooperativa dos Produtores Rurais de Brejo do Cruz(P), onde se situava o parque fabril da empresa, não seria um bom negócio. Dr. Camilo Calazans de Magalhães, diretor do banco para a região nordeste tinha grande paixão pelo tema “Cooperativismo” e, com certeza, veria com bons olhos uma possível proposta. Cooperativa pequena imagine, no sertão da Paraíba, de capital insignificante, dirigentes também pessoas humildes, sugeri que fosse feita uma assembléia geral para aumento do capital e, na mesma reunião, a devida autorização para entrar com a proposta de aquisição da usina.

            Um sucesso a reunião. Todo mundo já vibrava. Até parecia que a indústria já pertencia à cooperativa. Agora competia à agência fazer os estudos de praxe, avaliações e encaminhar o pleito à consideração superior. Assim que a proposta chegara a Brasília o Dr. Calazans desde logo designara um especialista em cooperativismo, conhecido em todo o Brasil – Dr. Apolônio, ao que parece --, a fim de que fizesse reuniões, examinasse tudo, orientasse e ficasse sempre fazendo visitas de orientações. Sinal de que a proposta fora bem aceita. Mas havia um problema. O valor de aquisição se equiparava mais ou menos ao valor dos bens e da proposta. O máximo que o banco poderia financiar era 80% do valor das garantias, penhor e hipoteca de máquinas e imóveis da empresa, o conjunto industrial.

            Restava ao Dr. Camilo somente uma alternativa, qual seja a de autorizar o adiantamento de 100%, em caráter excepcional, a fim de soerguer uma empresa de significativo valor para a região, agora democratizada com a participação de centenas de sócios cooperados. Não pensara duas vezes, assumiu a responsabilidade, agiu como verdadeiro “banqueiro” – e decisões assim devem ter contribuído para que chegasse a exercer a presidência do BB --, até porque não sairia dinheiro algum... Era contratar o empréstimo e liquidar as dívidas, elas por elas, como se diz na gíria.

            As receitas proporcionadas pelos débitos de Freitas Maia & Cia. Estavam todas numa conta chamada “Rendas em Suspenso”, que são aquelas receitas debitadas, mas não efetivadas, ou melhor, não pagas pelos devedores, passando de semestre em semestre pesando negativamente nos resultados da filial. Com a contratação do negócio todas as receitas foram efetivadas, elevando o resultado financeiro da agência. Que beleza! Ainda mais lindo seria voltar a ver aquela fábrica funcionando, trazendo empregos, criando rendas para os cidadãos e para um município pequenino como o era Brejo do Cruz. 
         

            Na presidência da cooperativa, Sr. Manoel, que também era tabelião, deu seriedade aos negócios, estava em boas mãos. Como gerente geral fora nomeado o Sr. Francisco, produtor rural e que também entendia do ramo de comércio e de beneficiamento primário de algodão, que nada mais é do que separá-lo do caroço, transformando-o em “pluma”, enquanto que do subproduto “caroço” ainda se retirava óleo e a sobra era “torta”, alimento rico em proteína para o gado, principalmente para vacas leiteiras.

            A solução encontrada fora um tiro certeiro no item “operações anormais” da agência, que agora estava dependendo apenas de pequenos atrasos de empréstimos agropecuários, e também da concretização das operações dom J. P. Dantas & Cia., que já voltara a operar com desconto de duplicatas, retendo-se parte dos valores. As negociações no Rio de Janeiro com a Cia. Carioca Industrial estavam avançadas. Na concordata ela se comprometera a pagar 75% de todos os débitos... era uma esperança, mesmo porque estava fazendo dois  anos. Toda a dívida procedente de Catolé se resumia a descontos feitos pela firma do Dr. Antônio Pinheiro Dantas... Liquidando lá na “cidade maravilhosa” o crédito chegaria e também quitaria tudo na agência.

            Vou ficando por aqui pra não cansar os leitores.
 
Um detalhe: As fotos de que necessitamos na internet estão condicionadas ao pagamento de direitos autorais, daí o autor não ter achado conveniente pagar por uma paisagem que é do mundo, não tem dono; uma pessoa chega, fotografa um logradouro público e se arrota o nome de proprietário. Todavia, estou solicitando ao BB que me forneça fotos da época.
 
Em revisão.
Ansilgus
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Enviado por ansilgus em 09/05/2012
Código do texto: T3657617
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