Sócio no cigarro

Muitas empresas fazem anualmente um exame médico para verificar o estado de saúde de seus empregados. A empresa onde eu trabalhava também. Eu detestava aquelas consultas porque minha pressão subia na hora. Bastava o medico colocar o aparelho no meu braço e ela disparava, dizem que isto se chama síndrome do jaleco branco. Além da consulta, havia alguns exames clínicos de sangue, urina, fezes e radiografia do pulmão.

Um dia, o médico ao examinar minha garganta e observar meu pulmão notou que eu tinha um problema nas vias respiratórias. Perguntou se eu sentia alguma coisa na garganta. Eu disse que alem de uma tossezinha seca, insistente, havia também uma coceira na garganta. Eu já conhecia o medico, ele tinha me examinado em outras ocasiões. Era um medico competente. Sugeriu então que eu procurasse um especialista, e me indicou um.

Fiquei preocupado por ter que procurar outro medico, principalmente, um especialista. Sentia-me incomodado só em pensar em outra consulta. Mas não havia alternativa. Ele me receitou um remédio para tosse, e enquanto escrevia a receita, repetia o nome do especialista:

- Dr. Sergio Pereira. Você vai consultá-lo e diga que fui eu quem o recomendou.

Depois de muita relutância marquei uma consulta com o pneumatologista indicado. Cinco dias depois, fui ao consultório do doutor Sergio. Como sempre, uma tremenda sensação de desconforto me acompanha quando entro num consultório médico, que aumenta à medida que o tempo vai passando. Mas, como um bom paciente, levei umas três horas para ser atendido, pareceu um século. Ao ser interrogado do por que da minha presença ali, falei da suspeita do médico e lhe mostrei a radiografia. Vamos ver disse ele escutando minhas costas, enquanto mandava que eu repetisse trinta e três. Depois de examinar minha garganta, durante uns cinco minutos, ele disse que tinha uma irritação, mas era coisa à toa. Quanto à radiografia não apresentava nada grave.

- Está bem doutor, admito que não tenha nada grave, e a coceira na garganta que às vezes me faz tossir?.

O medico me olhou firmemente e disse:

- O senhor precisa parar de fumar, o que o senhor tem é nada mais nada menos que as consequencias do cigarro.

Espantaram-me as palavras secas do médico ao falar do cigarro. Alarmado, respondi:

- Eu não fumo doutor, nunca fumei na minha vida.

Ele, retornando a conversa, retrucou sorrindo:

- Não exagere, pois não vou acreditar. Cuide-se para não precisar voltar.

No dia seguinte, ao ver a fumaça desprendida do cigarro do meu colega de sala, percorrer o espaço entre mim e ele em busca do meu pulmão, numa viagem sem parada, compreendi o que o medico quis dizer. Naquela época não era proibido fumar em recinto fechado e ele fumava um cigarro atrás do outro. Então a fumaça vinha, enquanto eu que não fumava, aceitava passivamente a sua chegada. Sem saber eu era sócio no seu cigarro e compartilhava do seu vício