Um nó lasso
Ela passou pela catraca e se sentou do meu lado. Nunca a vira antes. Sua pele parecia destacadamente morena contra o vestido, branco com tênues detalhes florais: pequenas pétalas verdes, azuis e amarelas. A cor da roupa, à força do contraste, faria sua pele mais morena do que de fato era? Só seria possível conhecer-lhe o tom da pele vendo-a nua? Como ela seria nua?
- Garoto, ela falou. Teriam meus olhos denunciado meus pensamentos? Creio que ruborizei.
- Sim, respondi fitando, mui gravemente, seus olhos. Perguntou-me se poderia ajuda-la e, ouvindo que sim, se estivesse ao meu alcance, pediu-me que refizesse o laço de suas costas. Assumi a tarefa. Não tinha, então, qualquer familiaridade com o gesto de despir, ainda que inocentemente, uma mulher. De imediato, lembrei-me da familiar ação de atar cadarços. Percebi, com a comparação, o quanto os meus andavam ásperos, sujos e fedidos.
-Tá bom assim? – Pode apertar mais. – Prontinho. – Obrigada!
Nada mais falamos.
Ela saltou antes de mim. Não voltaria a vê-la.
No ônibus, rememorei, três vezes e depois mais três, nosso breve encontro. Esforcei-me para guardar, em especial, cada detalhe daquele instante, daquela eternidade em que suas costas estiveram nuas.
Na escola, tão logo tive a oportunidade, virei-me para o João Vitor e, triunfante, joguei-lhe na cara:
-Você já viu uma mulher nua? Eu já!