MANHÃS ENSOLARADAS DE DOMINGOS
Ah! Aquelas manhãs ensolaradas dos domingos. Tem coisa melhor? Sem compromissos de horário, de trabalho, de escola. Um dia inteiro para você estabelecer sua agenda. Do jeito que você quiser, livre do mau humor do chefe, sem hora para levantar. Você acorda e olhando para o relógio dá uma espreguiçada, se vira para o lado e... perde o sono. Pois é. O hábito não deixa que você escorregue para baixo do edredom e durma mais um pouco. Mas, sempre é um dia especial. Um dia para dedicar à família, voltar a ser um pouco criança, brincar com os filhos no parque. Dia do churrasco, da cerveja gelada, da bermuda e das sandálias. Se estiver calor é dia de pés descalços que se sujam com a poeira da calçada e dos restos de carvão que se espalham pelo chão da churrasqueira. No final do dia é necessário pegar aquela velha escova de lavar roupas e esfregar os pés para tirar o encardido.
Domingo também é dia de passear de carro sem destino, procurando estradinhas ainda não percorridas nos subúrbios um pouco mais distantes. Minha irmã, Mari, é especialista em procurar “mares dantes nunca navegados”. Mas, deixando Camões de lado estou a lembrar (oh, raios! Deixei o gerúndio e usei o infinitivo; será que foi por causa do Camões?), como dizia, estou a lembrar de um destes domingos distantes que se perderam no passado e que faziam parte de um calendário que hoje estaria amarelado pelo tempo e cujas horas se passaram, mas deixaram uma pequena lembrança num recôndito de minha memória RAM (Restos de Antiguidades Misturadas).
As lembranças de nossos filhos quando pequenos são doces pelos momentos alegres que vivemos vendo-os crescer, a falar as primeiras palavras, a dar os primeiros passos. Ao mesmo tempo tem o sabor amargo da saudade. Surge um desejo de voltar ao passado, poder reviver momentos mágicos, apertá-los de novo em nossos braços, pegá-los no colo novamente. É uma coisa difícil de explicar. Saudades de nossas crianças que se tornaram homens de negócios, mulheres executivas, engenheiros, dentistas, vendedores, enfim, que hoje têm seus próprios filhos ainda pequenos e que um dia saberão compreender este sentimento quase inexplicável.
Muitos desses domingos de anos que se passaram guardam momentos inesquecíveis. Agora mesmo estou a lembrar (novamente Camões?) de um belo domingo em que peguei a família para dar um passeio no meu reluzente fusca azul pavão, ano 1971, que percorreu tantas estradas sem pedágio, muitas bem conservadas, quando o Governo Federal ainda não havia aderido a idéia de deixá-las em estado precário para justificar suas privatizações.
Mas, como dizia, Eu, a esposa, o Wallace meu filho e o meu Fusca saímos faceiros a passear para aproveitar a bela manhã dominical.
Logo depois da partida ouvimos um barulho inquietante no carro e começamos a nos preocupar. Quanto mais o carro rodava mais barulho fazia. Parei uma três vezes para tentar descobrir o que estava acontecendo, mas não conseguia descobrir o que poderia estar ocasionando aquele barulho irritante. Problema no freio? Barra de direção? Será perigoso? Algum mecânico nas imediações?
O Wallace, mais ou menos três anos de idade, não se furtava a dar um insistente palpite: - “Tem uma peda na loda”. Ninguém lhe dava atenção.
Cada vez mais preocupado, parei o carro, abri o capô para verificar se o ruído vinha do motor. Não ouvia barulho nenhum. Só quando andava.
Resolvi macaquear o carro e olhar por baixo. Nada, também.
Foi quando o Wallace colocou a cabeça para fora da janela e novamente palpitou: “Tem uma peda na loda”.
Lá pela quinta vez que ele afirmou que tinha uma pedra na roda resolvemos escutá-lo. E ele com seus olhinhos inocentes repetiu:
- “Tem uma peda na loda. Fui eu que pus".
Realmente, tinha uma pedrinha que ele havia colocado no orifício da roda e que fazia aquele barulho todo.
Ah! Estas manhãs de domingos ensolarados!
Ah! Que saudades daquele tempo.
Quantas pedras em nossos caminhos. Pedras que muitas vezes são fáceis de remover. É só saber ouvir os avisos que nos são dados.