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ESTATÍSTICAS

É... acho que morrer é assim. O fim. Não, o início. Cadê os caras? Não consigo levantar a cabeça. Será que já morri? Acho que aquilo é um pé... sapato bonito... de couro... Que barulheira. Vida besta. Não tinha visto como aqui é grande. Por que não dá para ver o lado de cá? Será que já morri? Cadê o barulho? Cadê os caras? Acho que antes de morrer a gente vai desligando devagarzinho... não ouve... não vê... não sente... A morte é a cessação dos sentidos. Onde eu li isso? Ou alguém me falou? E daí? Cadê a lâmpada? Cadê os caras? Coitada da minha mãe... O policial vai chegar lá em casa e dizer, a senhora precisa ser forte. Por que não chega ninguém? Que frio... Senti alguma coisa! E se o frio for um sinal? Cadê os caras? Será que ainda estão aqui? Será que já morri?

Alguém

Até que vendeu bastante hoje. Acho que já dá para ir embora. Quase três horas! Já deve ter parado de passar ônibus... Vou pegar um táxi... TÁXI! Que frescura... E essa droga de chuva que não pára... Nossa, como escureceu lá fora. Até o seu Joaquim já foi... Cadê o pessoal do posto? Devem ter entrado por causa da chuva... Mas não tem nem uma luzinha... Já pedi duzentas vezes para o menino olhar essa geladeira; a gente pensa que fechou... mas, a danada continua aberta. Deve ser essa borracha. Tem de trocar... Cem, cento e dez, cento e vinte, cento e trinta, cento e trinta e cinco, e seis, e sete, e oito... mais... quanto mesmo? Cadê o papel? Trezentos e quarenta e dois... mais os cento e trinta e oito... quatrocentos e oitenta. É, até que é um tanto bom. Mas, também, o tanto que tem de ficar nessa prisão. Só eu sei. “Fulano tá bem”, “Pintou a casa”, “Foi nos isteitis”... Amanhã cedo tenho de guardar essas latas. Ah, não... Por que eu não fechei logo?

Outro

No começo era só uma luz. Depois é que veio a voz. E a dor... Como doía... Depois melhorou. Hoje eu já nem sinto mais. Será que é isso mesmo? Hoje? Agora? Por quê? Não importa... a voz... a luz... A voz! A vida não precisa de explicação. Ela simplesmente acontece... Eu lembro do meu pai dizendo, as coisas são como devem ser... É a voz do meu pai? É engraçado como o escuro pode ser tão colorido. Azul lá em cima... vermelho ali do outro lado... amarelo... igual à luz! Ou ela era branca? Dizem que o branco é a mistura de todas as cores... Por que a noite não é branca? A luz não podia ser branca... ela não era mistura de nada... era única... original... inicial... iniciática... então, a luz era negra, ausência de todas as cores.... Início é ausência. Como pode existir alguma coisa antes do começo? Antes da luz não havia nada. Mas, e se o nada for alguma coisa? A luz! Amarela! Bem amarelinha! Vou entrar ali...

Mais um

Onde eu vou comprar cigarros uma hora dessas? Vício desgraçado. Já era para estar em casa. Cobertor... café quente... filminho... mas não, tem de fumar. Ano que vem eu paro. Vai ser a promessa de ano novo. Se eu não arranjar pelo menos um cigarrinho, não durmo. E amanhã ainda tenho de levantar cedo para levar a vó naquela porcaria... Droga de lugar! Como tratam a velha mal... mas, não tem outra opção... Também, na hora em que eu achar, eu vou fumar um maço inteiro, enfiar os vinte na boca de uma vez... vai ser a tragada do século... Não, vou comprar logo um pacote, para não ficar mais nesse aperto... Que frio. Será que o café não me mata a vontade? NÃO! Essa garoinha parece fumaça de cigarro... não, já é obsessão. Ano que vem eu paro. Na festa de ano novo só vai ter fumante... para comemorar... para despedir... Se eu conseguisse unzinho agora, eu morria feliz... Encruzilhada... vou dar uma de Robert Johnson. Lá na frente! Lá na frente! Vá para a luz Carol Anne...

Noticiário

Mais um ato de violência gratuita chocou ontem a cidade. Ninguém sabe dizer o que levou o jovem rapaz, aparentando entre 25 e 30 anos, a tal ato. Uma testemunha, que trabalha no posto de gasolina do outro lado da rua, viu quando o homem entrou na pequena loja de conveniência e já foi disparando. O homem não portava documentos e até agora não foi identificado. Em seus bolsos, apenas muitas balas de amendoim e uma passagem de ônibus bastante destruída – sendo, inclusive, impossível de se identificar quaisquer informações acerca da mesma. O que tornou a coisa ainda pior é que o vendedor, ao que parece, guardava um 38 embaixo do balcão e, prontamente, respondeu aos disparos. Ainda, segundo, também, a mesma testemunha, parece que havia mais uma pessoa no local – fato ainda não confirmado pelos policiais que estiveram no local, nem pela perícia. Incontestável é o aumento absurdo da violência urbana e a omissão das autoridades. A população exige respostas duras e rápidas. Quando isso terá um fim?

A seguir, veja os gols da rodada de ontem.