Feio, Sujo e Agradável.

Gerson e Magno na estrada.

Magno dirigindo e Gerson pensando em alguma coisa pra animar o ambiente. Os dois cansados, estrada ruim, longa e calor. Carro novo e ar condicionado quebrado, imagina! Nem ganhar na loteria sozinho traria humor aqueles dois naquela viagem. Um clima meio pesado pairava no ar e os dois pouco se falavam. Aquela era uma viagem de volta, os negócios não aconteceram como queriam e tudo contribuía pra esse mal humor. Mas nem sempre foi assim, alias, era o oposto. Sempre mantiveram uma amizade muito próxima – quase irmãos - e o alto astral reinava, principalmente em viagens. Mas esse dia era diferente. Duas da tarde e os dois com fome. Gerson não se importava, mas Magno era seleto quanto a cardápio. Mas dessa vez, pelas circunstancias, abriria uma exceção.

- Vamos parar em qualquer boca de porco que vier pela frente. Disse ele num tom meio rosnado.

Mal acaba de falar e aparece na frente um desses restaurantezinhos sem placa, feio, sujo e nenhum movimento. Meses depois, Magno, numa mesa de bar comentara que aquele restaurante era tão sujo que quando foi ao banheiro viu duas baratas, uma socorrendo a outra que estava com ânsia de vomito.

Desceram em silêncio e calados foram ao banheiro. Quando voltaram constataram que o salão estava vazio, não fosse pelo único caminhoneiro que já estava na mesa. O pé sujo era tipo self-service e Magno começou a pegar alguma coisa de um lado do Buffet e Gerson do outro. Mesmo estando de frente um pro outro o silêncio era total e os dois nem se olhavam mais, quando do nada, o caminhoneiro que estava sentado – que ninguém nunca vira na vida - resolve se aproximar pra repetir seu prato. Do canto do olho Gerson percebeu que ele queria puxar conversa, e que aquilo ia dar merda, e não deu outra. Ele pegou uma colher de arroz e disse:

- Arroiziiinho..

Pela primeira vez e depois de cinquenta quilômetros Magno e Gerson se olham com o canto do olhar. Dai o cara pega um pouco de feijão e solta:

- Feijãoziiinho..

Dessa vez com o volume um pouco mais alto. Como aquelas crianças que querem chamar a atenção da mãe e não conseguem. Dessa vez Magno não resiste e olha Gerson no cara a cara, mas continuam em silencio. Algo de estranho estava a acontecer. “Será esse o espião que aquela empresa mandou pra nos seguir!”, pensaram os dois ao mesmo tempo. Ou será carência afetiva, ou o cara é gay! O fato é que pelo menos estava acontecendo algo que mudara aquele ambiente, a relação Gerson e Magno estava mais próxima. Havia diminuído aquela distancia. E na salada, o cara:

- Saladiiinha...

Eles resistiram, fecharam a cara e foram pra mesa. Mas não conseguiram comer. Em uníssono e em bom tom, soltaram uma gargalhada que por fim chamou a atenção do caminhoneiro, que por sua vez não resistiu e, como já era previsto, pediu pra sentar-se junto a mesa. Mal ele se sentou e:

- Restaurantezinho bom esse hen!

- Vocês vem sempre aqui?

- São daqui?

Nessa altura Gerson e Magno já comiam como se estivessem numa churrascaria ala-Magno, aliás, riam mais do que comiam. O cara era muito da hora, muito gente boa e não era nada do que eles pensavam. Contaram muita piada e até riam dos problemas que estavam acontecendo.

Há pessoas que simplesmente tem a vocação, o dom pro bem, pra cumprimentar o outro, pra sorrir, pra contagiar, pra comemorar a vida. E esse cara era um deles. Mais tarde Gerson estudou esse fenômeno num livro de Daniel Goleman e descobriu ser a tal da Inteligência Emocional. Isso mesmo, por inteligência no que você sente.

Mas isso é uma outra historia. O fato é que esse cara, o caminhoneiro, acabou salvando a viagem. Terminada a refeição eles se cumprimentaram, Magno pagou a conta, pegaram o telefone uns dos outros e partiram. Mantiveram uma relação de amizade por muito tempo. Quando entraram no carro, Gerson e Magno tiveram que esperar um tempo pra que passasse a crise de riso que contagiava os dois. A viagem de volta foi muito agradável e puderam pensar em muitos outros projetos. No futuro e por muito tempo, o complicado era resistir as piadas que Magno sempre fazia quando iam a algum self-service:

- Arroiziiinho..

- Feijãoziiinho..

GersonRsilva
Enviado por GersonRsilva em 11/04/2012
Reeditado em 11/04/2012
Código do texto: T3606576
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