AUF WIEDERSEHEN

AUF WIEDERSEHEN

I

Assim que desceu do taxi, e retirou suas malas, Everardo notou a casa como que abandonada. Há já um bom tempo, pelo jeito. As janelas cerradas, com aspecto sujo, a porta, igualmente empoeirada, tinha seu rodapé cheio de folhas secas, demonstrando não ser aberta de longa data. Nenhum vestígio de estar habitada. Ficava num bairro de classe média da capital de São Paulo, na Saúde.

Tudo aconteceu há um ano. Executivo de uma multinacional, Everardo chegara a esse posto galgando degrau por degrau. Começou como simples escriturário, no setor de compras. Nem bem havia completado dezoito anos. Inteligente, e mais que isso, voluntarioso, demonstrava grande interesse em aprender tudo o que fosse útil, para bem exercer suas funções. Assim, angariou a simpatia de seus superiores. E, foi crescendo na empresa. Supervisor, chefe, assessor da diretoria e, finalmente, conquistou um cargo de diretor. De Relações Industriais. Com todo merecimento. Além de respeitado como profissional, detentor de diversos cursos na área industrial, sempre teve um procedimento muito simples, tratando seus subordinados com muito carinho, sem nunca perder a autoridade. Ademais, como a matriz da empresa se situava na Alemanha, a cada mês, mês e meio, havia necessidade de para lá viajar. Mais precisamente para Hamburgo.

Paralelamente, a vida social de Everardo se modificou de forma total.

Sua posição, como executivo, o obrigava a frequentar a sociedade, comparecendo a jantares, festas, cocktails, e outros eventos.

Vindo de família simples, e tendo se casado com uma mulher de mesmo nível, como ele vindo do interior, não acostumada a participar desse tipo de eventos, ele sempre comparecia aos mesmos desacompanhado.

Com 25 anos, boa aparência, simpático, bem posto profissionalmente, não foi difícil despertar o interesse do sexo feminino. Passou a ser assediado, tanto pelas mulheres que faziam parte da empresa, e, mais ainda, pelas que participavam das comemorações em que ele se fazia presente.

Everardo resistiu por um bom tempo. Pensava na mulher, fiel companheira, no filho. Tinha uma vida feliz.

Chegou um momento, todavia, em que a fortaleza sucumbiu. Porque, não são somente os anticorpos que o homem possui para se defender do ataque das interessadas, que o deixam incólume. Deve-se levar em conta, também, o orgulho de demonstrar sua masculinidade. Nenhum homem deseja ser apontado como aquele que desprezou uma mulher. Pura vaidade!

Diva, sua mulher, impávida, assistia a tudo. Simplória, sua única razão de viver era cuidar do filho, Marcelo, de apenas dois aninhos, do marido, e dos afazeres domésticos. Esse o seu mundo. Tinha seus predicados, era uma moça bonita. Entretanto, com nada se importava.

II

Num dos eventos promovidos pela empresa, veio da Alemanha um grupo de executivos, chefiado pelo presidente. Aproveitou para trazer sua família, esposa e filha.

Herta era uma dessas loiras estonteantes. Corpo escultural, olhos azuis, lábios carnudos, 1,72m de altura. Vinte e dois anos. Na recepção de boas vindas, no hotel mais chique de São Paulo, sem dúvida, ela foi o centro das atenções. Durante as formalidades de apresentação, o encontro dos olhares da moça, com os de Everardo, foi fulminante. Aquele fluido que nasce espontâneo, quando há a atração entre dois seres, veio com um vigor tão forte, impossível de ser reprimido.

Foram quinze dias de intensa paixão. Almoços, jantares, cinema, teatro e, inclusive, motéis. Everardo esqueceu, até, de que era um homem casado. Somente aparecia em sua casa para dormir.

A situação chegou a tal ponto, que até Diva, sempre cordata, nunca reclamando, não aguentou! Explodiu!

- Everardo, a vida desse jeito não pode continuar! Estou sendo um simples objeto para você! Não liga mais nem para seu filho. O que está acontecendo?

Everardo, então, se abriu.

- Estou apaixonado por outra mulher! Aconteceu, não pude evitar.

Acho melhor revermos nosso casamento. Não consigo ficar mais aqui.

Vamos nos separar.

Propôs o divórcio.

Diva não concordou! Nada de divórcio. Se quisesse ir embora, que fosse. Jamais assinaria qualquer papel.

- Tudo bem, então! Estou sendo transferido para a Alemanha, para a matriz da empresa. Dentro de poucos dias estarei longe daqui.

Dito e feito. Em poucos dias estava ele em Hamburgo. De mala e cuia, como diz o ditado.

Diva, abandonada, sem ter como sustentar a casa, pois jamais havia trabalhado na vida, não teve outra saída. Pediu socorro aos pais, e lá foi morar com eles, no interior.

III

Um mês se passou. Herta ficou grávida!

Assim que recebeu o veredicto do médico, ficou exultante!

- Querido! Uma novidade! Você vai ser pai!

Everardo vibrou! A notícia serviu para minorar, em parte, o sofrimento que ele vinha passando, desde que chegou em Hamburgo.

Não era para menos. Sua origem, o país estranho, não dominar a língua, o clima, a somatória de tudo influía em sua pessoa, e, na realidade, não estava sendo feliz. Outro ponto. O alemão, por natureza, é um povo frio. Herta não era daquelas mulheres de ficar fazendo carinho a todo instante. Tinha seu grupo de amigos, e era ali que representava estar à vontade. Então, Everardo sentia-se solitário.

A saudade do lar antigo, de Marcelo, o filho que havia deixado com apenas dois aninhos. Jamais, nesse tempo de separação, teve qualquer notícia do menino. Será que ele sentia a ausência do pai?

Porém, o trabalho, a boa posição que ocupava na empresa, com ótima remuneração, fazia com que ele superasse os momentos de baixo astral.

O tempo, inexorável, foi passando. Dois, três, quatro meses...! Nove meses!

Até que Herta vai para a maternidade. Era chegada a hora!

- Não! Não pode ser meu filho! Em minha família, desde meus ancestrais, inexiste qualquer membro que não seja branco!

Nos braços da enfermeira, lhe era apresentado um bebê muito bonito, forte, mas... Totalmente negro, com cabelinho encaracolado! Uma graça de criança!

IV

Dias depois, Everardo ficou sabendo.

Herta, antes de viajar para o Brasil, quando se conheceram, tivera um romance passageiro com um membro de uma equipe de futebol africana, que havia feito uma excursão pela Alemanha.

Aristeu Fatal
Enviado por Aristeu Fatal em 08/04/2012
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