A VISITA DO PAI

O ruído da tranca veio como uma chicotada nas costas de José. O odor no ambiente, um misto de mofo e suor, característico de um cômodo fechado, mais as fisionomias "fechadas" dos homens, completavam o cenário naquele famoso presídio do Rio de Janeiro. José estava alí pela primeira vez desde a prisão do filho, Luiz. Chegara as seis da manha, daquele domingo. Passara por todos os procedimentos. Em cada etapa, sentia as lágrimas molhando o velho rosto. Desde o portão principal, os olhares eram de desprezo. Afinal era mais um "parente de um bandido". Decidiu pelo silencio. E assim foi.

Pensava no filho. Um jovem de vinte e dois anos. Um menino que desde cedo optou pelos sonhos de uma vida que a família não podia pagar. Diferente, "bem diferente" dos irmãos, Luiz, logo passou a "dar trabalho" e mesmo com as correções, de tempos em tempos, aprontava. Com o passar do tempo, vieram as novas amizades, os bailes e os convites. Primeiro para "olhar as coisas"; depois para "sinalizar caso algo diferente surgisse" e finalmente a "honra" de ser mais um naquele "exercito" que, ainda hoje, domina algumas comunidades do estado. José lembra quando foi buscar o filho e encontrou um homem que até então não conhecia. Lembra-se ainda das palavras ofensivas: "Vá embora velho burro. Não serei como você, um burro de carga que trabalha de sol a sol e não tem nada". Sentiu esta dor no intimo. De certa forma, o filho tinha razão. O que construíra até alí? Nada, além de uma pequena casa, quarto, sala cozinha e banheiro, onde morava com mais dois filhos e a esposa, Ana. Sentiu a dor da vergonha. Baixou cabeça e voltou para sua vida.

Desde então, só escutava os boatos sem comentar. O tempo passou até que numa madrugada, José despertou ao som de batidas na porta. Era o filho Luiz, ferido num confronto; "Pai me ajuda". Recolheu-o, esperou o amanhecer e levou-o ao hospital em estado grave. Descoberto pela Policia, passou a ser escoltado na enfermaria. Depois da recuperação, Luiz foi levado para um presídio.

"Vamos lá coroa", a frase de um dos carcereiros, despertou José das lembranças. Agora, só restava mais uma porta de aço. Ela abriu-se. Deu para um grande cômodo onde vários rapazes esperavam com uniformes azuis. No canto, um rosto familiar apesar da barba. Luiz. Reparou o filho mais magro. Feições tristes e olhar vazio. Um sorriso tímido foi o "bem-vindo". José, em silencio, olhou em volta: havia tristeza no ambiente, apesar dos sorrisos de reencontro.

Não pensava em nada, só sentia o amargo do momento.

De súbito viu Luiz, ainda bebê, estendendo os bracinhos pedindo, mais uma vez, socorro.

Um sentimento de pai tomou conta do velho coração. Correu mais uma vez para o filho. Abraçou-o com amor e disse, mais uma vez: "Papai está aqui. Fique tranqüilo. Papai não vai te deixar sozinho".