Bicho papão

Numa bela tarde de domingo, as crianças brincavam na rua, e riam, e choravam e iam para suas casas; mas depois saiam de banho tomado e sujavam-se novamente sem dó. O ciclo de diversão parecia estável.

Já eram oito horas da noite (eu gostava de falar assim quando criança...) e um menininho, cujo nome não me recordo e não lhe atribuirei nenhuma graça inventada, estava sozinho, na rua, brincando sentadinho na sua calçada com bolinhas de gude.

Um carro virou a esquina cuidadosamente e parou em frente ao menininho. Este levantou os olhos verdinhos e olhou para o pote repleto de bolas de gude. Ele se levantou e foi até o moço desconhecido.

Sem pensar na sua casinha, o menino entrou no carro do moço e partiu, deixando para trás as suas bolinhas na calçada.

A mãe do menino chamou-o várias vezes, e nem um grito foi respondido. As bolinhas estavam sem o dono...e não mais coloridas pareciam. Preocupada, perguntou para os vizinhos, e eles não sabiam como ajudar. Ninguém tinha visto o pobre menino de oito anos.

Foram anúncios, súplicas, polícia e tudo o mais, nenhum sinal do menininho.

Sequestro? Era o que todos pensavam no começo. Mas passado dois meses, nenhum resgate fora pedido. Que tortura para a mãe e os seus dois irmãozinhos...A saudade era tamanha daquele garotinho.

Uma certa noite, a mãe teve um triste sonho: seu filhinho brincava com as bolinhas num grande círculo de fogo...e estava preso. Sua inocência estava perdida, pois seus olhinhos esperançosos foram arrancados...e seus pezinhos tiveram o mesmo fim.

A mãe ficou tão triste que teve que ser internada num hospital para doentes da cabeça...

Coitados dos irmãozinhos! Não tinham com quem ficar, pois os quatro avozinhos tinham partido já para o céu...e o pai nunca tinha ocupado o seu cargo de pai dos meninos. A vizinha bondosa ficou com os dois pequenos para cuidar.

E assim foi a triste história de uma criança cujo ciclo de diversão durou muito pouco. E depois de algum tempo, o menino virou lenda. E naquela rua, nenhuma criança brincava mais sozinha, pois as mães ficavam com medo de ficarem loucas com o desaparecimento dos seus filhinhos.

Quimera
Enviado por Quimera em 18/03/2012
Reeditado em 26/06/2012
Código do texto: T3561899
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