Correspondência (Dragões sabem ler ou apenas calcular?)

Ela escreveu um bilhete com um texto plagiado (havia aprendido muito cedo o significado da palavra plágio):

"Eu desço dessa solidão

Espalho coisas sobre

Um Chão de Giz

Há meros devaneios tolos

A me torturar

Fotografias recortadas

Em jornais de folhas

Amiúde!

Eu vou te jogar

Num pano de guardar confetes

Eu vou te jogar

Num pano de guardar confetes...

Disparo balas de canhão

É inútil, pois existe

Um grão-vizir

Há tantas violetas velhas

Sem um colibri

Queria usar quem sabe

Uma camisa de força

Ou de vênus

Mas não vou gozar de nós

Apenas um cigarro

Nem vou lhe beijar

Gastando assim o meu batom...

Agora pego

Um caminhão na lona

Vou a nocaute outra vez

Prá sempre fui acorrentado

No seu calcanhar

Meus vinte anos de "boy"

That's over, baby!

Freud explica...

Não vou me sujar

Fumando apenas um cigarro

Nem vou lhe beijar

Gastando assim o meu batom

Quanto ao pano dos confetes

Já passou meu carnaval

E isso explica porque o sexo

É assunto popular...

No mais estou indo embora!

No mais estou indo embora!

No mais estou indo embora!

No mais!..." *

Mas depois de molhar a frase "meus vinte anos" com uma lágrima rasgou-o.

Sabia que não precisava enviar bilhete nenhum.

(O Dragão sonhava com seus pensamentos todas as noites e no dia seguinte avisava, com detalhes. Só não sabia se queria ser avisada.)

* "Chão de giz" - Zé Ramalho

Caroline Garcia Cruz
Enviado por Caroline Garcia Cruz em 15/03/2012
Código do texto: T3555490
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