UM GAROTO ESPECIAL

Robin era um garoto especial. Muito especial, sorriso bonito, alegre, ágil e educado. Estava sendo levado por Beto, que segurava sua mão com vigor, com medo de que ele pudesse se soltar e sair correndo, tamanha sua felicidade por estar caminhando pelas ruas.

Sua relação com Beto aconteceu quando em um dia de visita Robin admirava as formiguinhas que enfileiradas desfilavam sobre a borda do canteiro das rosas. Eram tão pequeninas, mas ágeis e não temiam a sua presença, sempre caminhando em fila, transportando aquelas enormes folhas até o formigueiro. Beto o notou e ficou observando. Menino bonito, de olhos grandes rosto delgado, um pouco magro, mas, naquele orfanato não havia nenhum gordinho.

Beto logo percebeu que Robin se mostrava decidido como se a sua experiência de vida lhe houvesse indicado um caminho para percorrer.

A sua concentração no trabalho das formigas o impediu de notar o interesse de Beto. Foi quase um susto, quando se aproximando do garoto o rapaz lhe disse:

- Olá! Qual é o seu nome?

O garoto levantou-se, esfregou as mãos, uma na outra, como se as estivesse limpando, estendeu-a ao desconhecido e se apresentou:

- Eu sou o Robin, moro aqui e você, quem é?

- Eu sou o Beto, vim convidá-lo para passar um fim de semana na minha casa. O que acha?

Robin esboçou um sorriso, agradeceu e aceitou o convite. Já estava acostumado com aqueles fins de semana. Vez ou outra alguém aparecia e levava um dos seus colegas para um passeio, mas no domingo à tarde o traziam de volta. Sabia que assim seria, como acontecia com todos. Dormiria um dia em uma cama estranha, mas no domingo poderia voltar para dormir na sua própria cama.

Robin não era o único. A instituição que o acolheu após o nascimento, era tida como padrão e de excelente qualidade. Há seis anos passados, uma jovem grávida, já morando nas ruas cerca de 2 anos, não tinha para onde ir nem como se cuidar durante a gravidez, procurou a instituição para pedir ajuda.

Milena, a jovem moradora de rua, havia abandonado sua casa ainda adolescente seus pais não a queriam mais por lá, por causa das drogas que usava. Saía de casa e enveredava pelos tortuosos caminhos dos drogados e só retornava dias depois. Assim foram vários anos de lutas e consultas com especialistas, internamentos em clinicas especializadas e nada conseguiu afastar Milena do convívio com as drogas.

Só lhe restou abandonar o lar e permanecer de vez nas ruas, se prostituindo para alimentar seu vício. Acabou engravidando e já sem recursos para as drogas, era rejeitada por todos os seus antigos companheiros de desventuras.

Aproximou-se da instituição umas três vezes, com a intenção de pedir ajuda, mas em todas elas perdeu a coragem. Temia ser expulsa, pela sua péssima aparência. Suja, cheirando mal e vestindo roupas que mais pareciam pedaços de trapos, amarrados um ao outro, de tão usados e sujos.

Um dia, ao aproximar-se chegou a levantar o braço para tocar a campainha, quando uma Senhora abriu o portão e lhe disse:

- Entre, minha filha. Milena quase desmaiou com a surpresa. Parecia que havia sido apanhada fazendo algo errado.

Também a vida nas ruas não é fácil. Quem vive lá sabe que de tudo são culpados, estão sempre sendo chutados e expulsos de algum lugar, isso quando não os acusam de roubos e outros delitos. Por isso estão sempre esperando a reação de alguém contra a sua presença.

Mas como o convite daquela Senhora que lhe pareceu tão distinta e tão amável soou para ela como uma ordem. Sem mais pensar, adentrou ao Orfanato e foi acompanhando aquela Senhora que a conduziu até o andar superior. Eram corredores compridos com várias portas e muito limpo. Não parecia nem um pouco com as calçadas que estava acostumada a dormir.

De repente pararam em frente a uma fila de armários, onde a senhora que a conduzia retirou algumas roupas limpas, uma toalha e lhe indicou uma porta, dizendo:

- O banheiro fica ali. Lave-se e troque a roupa, quando terminar, volte aqui.

Assim fez Milena. O banheiro era espaçoso com vários boxes de vidro e granito. Em cada um havia um chuveiro ou um vaso sanitário. Entrou no primeiro chuveiro que encontrou, desfez-se das roupas e tomou o banho que estava precisando há meses. Ao terminar, deixou a velha roupa no próprio banheiro, vestiu a que recebeu e voltou ao local onde a esperava aquela senhora.

Ali começava a história de Robin, que recebeu, ainda na barriga da mãe os primeiros cuidados. Exames, remédios para todas as infecções ou alterações possíveis, naquela gravidez descuidada, já bem adiantada. Calculou o médico uns sete meses.

Ali permaneceu Milena recebendo todos os cuidados, até o nascimento da criança que aconteceu alguns meses mais tarde.

- É um belo garoto, disse-lhe o médico. Forte e muito corajoso. Veja só como tem os pulmões fortes. O choro de Robin ecoou por toda sala e corredores.

Durante o tempo que aguardava o nascimento de Robin, Milena recebeu muitas orientações, conselhos, assistência psicológica o que era uma rotina na entidade. Os dirigentes procuravam orientar as gestantes a abandonar as drogas e adotarem uma vida normal para cuidar dos filhos.

Até que algumas mães conseguiam. Abandonavam o submundo do vício e começavam a trabalhar e até recebiam ajuda do orfanato que mantinha uma creche para cuidar das crianças enquanto as mães trabalhavam.

Com Milena foi diferente. Não conseguiu. Não que não desejasse muito e queria criar o filho com conforto e dar-lhe a educação que não recebera em sua casa. Mas uma fatalidade, durante o parto, a levou embora.

Robin, órfão, nem podia desconfiar como seria sua vida dali para diante. Muito querido por todos. Recebeu a educação padrão, assistido por profissionais que dedicavam suas horas de folga ao orfanato, sem remuneração. Ali viveu seus primeiros anos de vida e quando saiu já era um garoto independente, sem carências e disciplinado. Havia sido criado, como todos, para se adaptar a qualquer tipo de vida que viessem a ter no futuro.

Andava Robin pelas ruas, seguro pelas mãos fortes de Beto, rumo à casa onde passaria o fim de semana.

Tudo lhe chamava a atenção. Um ônibus que passava cheio de passageiros em pé. Outro quase vazio, as pessoas que atravessavam as avenidas quase correndo. Outras que passavam por eles também caminhando depressa.

Pergunta, então, a Beto:

- Por que as pessoas estão sempre com pressa?

Beto então lhe explica que são pessoas ocupadas que cumprem horário para tudo. Para começar o trabalho, para almoçar, para pegar o ônibus, na volta para casa. Têm hora para tudo. Se atrasarem, perdem o dia, perdem o almoço ou o ônibus para voltarem à casa.

A cabeça de Robin funcionava com uma velocidade incrível. Tudo observava, perguntava, consentia, quando recebia a resposta de Beto. Desse diálogo foi surgindo uma mútua simpatia.

Beto admirando Robin que por sua vez admirava Beto pela sua sabedoria ao lhe responder as perguntas.

O fim de semana foi diferente. Na casa de Beto havia cão, espaço para brincar, árvores onde muitos pássaros cantavam, e uma gangorra que Robin não conhecia e ficou impressionado com a sensação de estar voando quando balançava de um lado para o outro, sempre sob os cuidados de Beto.

Beto era um homem comum, desses que encontramos em qualquer lugar, todos os dias. Mas tinha uma diferença: um coração imenso, assim como o de sua esposa Miriam.

Queriam tanto um filho, mas não conseguiram, após todas as tentativas possíveis, com a ajuda da medicina, Miriam não conseguia manter a gravidez por mais de duas semanas. Até que desistiram e conversando, optaram por uma adoção.

Já haviam procurado em muitos lugares, mas jamais encontraram um menino como Robin. Este é o nosso filho, afirmou Miriam ao final do dia. Beto, que já estava empolgado com o garoto concordou.

À noite, após colocarem o menino para dormir, foram conversar sobre as atitudes que deveriam tomar a partir dali.

Decidiram pedir a adoção de Robin. Não havia mais o que esperar, o menino os deixara encantados.

No dia seguinte, após o café, chamaram Robin para a varanda e começaram a conversar com ele.

Robin, disse Miriam:

- O que acha de viver para sempre nesta casa? Nós gostaríamos de ser seus pais.

Robin não entendeu bem o que estavam dizendo. Viver ali? E as suas professoras? E seus amigos? O que fazem os pais?

Disparou uma saraivada de perguntas que prontamente lhes foi respondida com carinho e de forma convincente.

Decidiu, então Robin a deixar o orfanato, onde nascera para viver como filho de Beto e Miriam.

Hoje Robin não é mais um garoto, mas um homem. Um homem que trabalha, como qualquer outro. Que tem uma família, mulher e filhos e ainda mora na mesma casa que o acolhera aos seis anos de idade. Seus pais, adotivos, já haviam partido para a outra vida. Os pais biológicos, jamais soube quem eram. Não os conhecera, assim como não havia nenhum registro sobre eles na Instituição onde crescera.

Muitos casais sem filhos querem adotar um garoto como Robin. Afinal ele era um garoto especial.

Mas muitos Robins existem em quase todos os orfanatos, brincando com as formigas, esperando o “seu Beto” aparecer, para então iniciar a verdadeira e definitiva etapa de suas vidas, que culminará com uma família bem estruturada e feliz.

Seja um Beto na vida de algum Robin.

Ele o espera, lá naquele jardim, brincando com as formigas.

Neodo Ambrosio
Enviado por Neodo Ambrosio em 14/03/2012
Reeditado em 11/05/2012
Código do texto: T3553377
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.