Escolhendo óculos

Era uma profusão de óculos a sua frente. Diversas marcas, diferentes modelos, armações grossas como pede o estilo da moda atual, todos pretos e com lentes escuras. Ela experimentava um por um e ao experimentá-los olhava para o espelho colocado sobre a mesa, fazia movimentos com a cabeça, para os lados, para baixo e para cima. Depois se voltava para mim, abria um sorriso largo, como se perguntasse: “este fica bem em mim?” Sem esperar resposta, retornava aos óculos. Vestida de preto, saia justa, não muito curta, um pouco acima dos joelhos, cabelos pretos, lisos, curtos, tipo chanel, corpo bem moldado, não muito alta, 1m65cm, que o sapato modelo scarpin elevava sua altura para 1m72cm. Não era um monumento de mulher, mas uma figura de encher os olhos, e outras coisas mais.

Ficamos mais de uma hora nesta troca de olhares, eu à espera de meus óculos que foram levados para uma sala contígua à recepção e ela a escolher aquele modelo que melhor conformasse com seu belo rosto. Em nenhum momento trocamos palavras, apenas olhares.

Depois de receber meus óculos já consertados, caminhei até a porta de saída, apertei o sensor manual de abrir a porta de carro e dirigi-me a ele. Quando já estava com o motor ligado e prestes a movimentar o veículo e sair em direção ao meu apartamento, senti um toque suave de uma mão macia sobre o meu braço esquerdo.

Tomei um susto, confesso. Imediatamente levantei os olhos em direção à pessoa que me tocava e enxerguei aquele olhar que há pouco me fitara várias vezes. - Você poderia me dar uma carona?

Surpreso e tartamudeando, respondi: - Claro, claro, para onde você, você deseja ir?

- Para qualquer lugar, desde que fiquemos a sós, respondeu ela com firmeza.

Mais uma vez senti-me surpreso. Eu não estava acostumado a investidas dessa natureza, ainda mais partindo de uma mulher bonita, elegante e jovem, como aquela. Mil coisas desfilaram em minha mente, mas nada ficava estático, eram pensamentos voláteis e confusos. Eu não conseguia concatenar as ideias. Não encontrava uma saída. Precisava responder de imediato e não sabia o que dizer.

É duro ser de meia-idade e se ver em tal situação. Havia a responsabilidade com a família, a esposa esperava em casa. Era preciso deixar para lá os maus pensamentos. Só que não eram tão maus assim, pois estavam mexendo comigo, fazendo-me levitar, tal e qual como na propaganda do “red-bull”. Meus pensamentos estavam criando asas e deixando-me em estado de total frenesi.

Rapidamente destravei a maçaneta da porta do carro, convidei-a a entrar, baixei o freio de mão e dei partida no motor do carro. Não tinha noção aonde ir. Tinha receio de levá-la diretamente para um motel, não sabia qual seria a sua reação a um convite como esse, nem mesmo se era isso que ela estava procurando, eu não a conhecia. Andamos em linha reta por muito tempo, àquela hora o trânsito ainda permitia desenvolver velocidade média de 60km/hora. Quando percebi, estávamos chegando ao Eusébio, cidade distante de Fortaleza 25km.

A moça ao meu lado continuava calada, e eu também. Nem mesmo havia perguntado seu nome. Eu tinha medo de quebrar aquele encanto. Por várias vezes olhei para ela; cabeça recostada ao banco, lábios entreabertos e cabelos ao vento, pois baixara o vidro da janela ao seu lado, expunha toda a sua juventude e uma tranquilidade de alguém sem problema.

Eu me perguntava – Por que uma garota entraria no carro de um desconhecido e se deixava embalar pelo som de uma música vinda de um toca-cd de um carro em movimento? O que estaria ela pensando? O que se passava pela sua cabeça? Eu não ousava perguntar.

Agora já passavam das 17h30min. Para iniciar uma conversa, perguntei se ela estava com sede, com fome. A resposta foi sim. Não sei se com sede ou com fome. Parei em frente de um restaurante, quando ia descendo ela pegou em meu braço e disse:

- Aqui não, prefiro um lugar mais íntimo, mais aconchegante. Vamos para um motel, mas para um motel de classe. Lá teremos paz, tranquilidade, conversaremos e você ficará sabendo tudo sobre mim.

Olhei para o relógio, àquela hora eu já deveria estar chegando em casa. Desliguei o celular, para não ser incomodado, isto é, encontrado, para não ter que oferecer desculpa esfarrapada, mentir por telefone. Eu não seria capaz de tamanha proeza. Nunca havia feito isso em meus 38 anos de casado.

Chegamos ao motel, entramos e pedi para a atendente a suíte presidencial. Era uma moça atraente e bem vestida, que me desfechou um olhar atravessado, interpretado por mim como de reprovação. Para o que estava prestes a acontecer, tudo teria que ser perfeito. Nada poderia atrapalhar, eu agia como adolescente, nervoso, trêmulo. Embora imaginasse o que poderia acontecer depois daquele encontro, eu estava disposto a ir até o fim, não poderia desperdiçar a felicidade que esperava alcançar naquele momento.

Dirigimo-nos ao apartamento. Passei o cartão e a porta se entreabriu, abri-a por completo. Ela entrou e eu a segui. Lugar discreto, mas luxuoso.

Ela sentou-se em uma poltrona espaçosa de couro colocada em frente da cama, ainda guardando aquele semblante de felicidade, olhou-me com carinho e descalçou-se displicentemente. Olhei para os seus pés, perfeitos, embora pequenos para a sua estatura. Tive vontade de beijá-los, mas contive-me.

Aquilo tudo já demorava duas horas. Ela continuava sentada na poltrona de couro. Vez por outra trocava a posição das pernas. A esquerda sobre a direita, a direita sobre a esquerda, as duas sobre o sofá de couro. A cada movimento, eu ficava na expectativa de ver suas belas pernas. Sentado à beira da cama, agora um pouco desanimado, eu consultava o relógio constantemente. De repente ela ficou de pé, olhou para mim e perguntou: - O que é mesmo que estamos fazendo aqui?

Mais do que depressa, respondi: - Viemos para ficar um pouco a sós, era o seu desejo. Eu achava que você estava precisando de um pouco de companhia, de carinho. Mas, você se fechou, ficou aí calada, olhando para não sei onde e eu perdi a vontade de conversar também.

Ela sorriu e disse: - Ainda bem que você não disse que perdeu o tesão por mim. Eu sei, você me deseja, me quer, mas não tem coragem de se declarar. Vamos, chegue mais perto de mim, eu também lhe desejo.

Aproximei-me, ela me pegou pela cintura e me jogou sobre a cama. Subiu sobre o meu corpo, antes puxando sua saia até acima das coxas. Sem reação, me deixei levar. Ela começou a afrouxar o meu cinto e aos poucos tirar as minhas calças. Nessa hora me entreguei todo. Agarrei-a pelo pescoço, puxei-a para perto de mim e iniciei uma série de beijos e mordidas leves em seus lábios, face e pescoço. Desabotoei o seu vestido e com sofreguidão desvesti seu belo corpo.

Tudo aquilo era novidade para mim, não pelo ato em si, mas pela maneira como ele estava acontecendo. Tudo rapidamente, tudo antecedido de muitas surpresas. O próprio local era para mim novidade, pois jamais havia frequentado um motel. Minha mulher nunca manifestara desejo de conhecer um e eu, por respeito, também nunca a convidara.

As carícias dela não paravam, parecia necessitar mais do que eu naquele instante, embora eu desejasse que aquele momento não mais tivesse fim. Era uma sensação gostosa, um prazer intenso percorria todo o meu corpo, trêmulo, eu levitava e minha mente desembocava em estado amnéstico, nada mais importando, somente aquele momento existia. A imponderabilidade de meu corpo presenciava toda aquela manifestação de gozo. Eu tinha medo que aquilo estivesse apenas no plano virtual, na vontade de sua realização, na imaterialidade de meus desejos mais contidos. Seria uma pena, pois eu me encontrava em viagem, rumo ao desconhecido, ao infinito de todos os mundos, de todas as galáxias. Eu era um superacelerador prestes a explodir como o big-bang.

Ficamos assim não sei por quanto tempo. Ambos desnudos e felizes por termos chegado ao orgasmo. Não houve necessidade de penetração, também ela havia confessado ser virgem e com casamento marcado para aqueles próximos dias. Essa confissão me assustou, juntamente com o pedido de não procurá-la nunca mais. Não fiquei sabendo dos motivos de agir assim, respeitador, concordei. Vestimo-nos, fomos para o carro e deixei-a em frente da óptica, que ainda se encontrava aberta. A última visão que tive dela foi ultrapassando a porta de entrada da loja.

No caminho para casa retomei a consciência de meu ato. Diria ou não diria o que acontecera naquela tarde? Não me sentia culpado pelo acontecido, pelo contrário, estava satisfeito e tinha certeza de que havia colaborado para que uma jovem tomasse uma decisão séria em sua vida. Só não sei se ela realmente se casara. Para mim, entretanto, abria-se um buraco negro em minha vida. Eu seria engolido por ele? Como enfrentar a família depois de tudo o que acontecera? Haveria compreensão da parte deles, principalmente de minha mulher, que nunca fora submetida a situação semelhante? Isso é outra história.

Gilberto Carvalho Pereira
Enviado por Gilberto Carvalho Pereira em 10/03/2012
Reeditado em 23/03/2012
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