A JANELA DA JUSTIÇA
Maria Regina era conhecida em toda cidade por seus intrompérios e absurdos que eram lançados ao primeiro pobre coitado que tropeçasse em seu caminho. De fato, me parecia temida. Reinava absoluta na certeza do poder físico, monetário e social que exercia diante de todos.
Numa manhã, sentou-se próxima à janela da repartição para ler o jornal com as notícias locais, quando ouviu uma voz lhe gritar:
_Gostosona!
Mesmo correndo, não conseguiu alcançar o famigerado e atrevido homem que tivera a audácia de lhe proferir tal absurdo. Os dias passavam e a idéia de sentir o pescoço do atrevido em suas mãos não lhe saía da cabeça.
Durante uma semana, ela encontrou em sua mesa cartas dando-lhe conta dos absurdos que aquele meliante em segredo de alcova, fantasiava. Todos queriam saber quem era o homem corajoso que ousara enfrentar a fúria de Maria Regina.
O tal homem um mês depois, não se contentou com o anonimato e revelou-lhe sua face ao passar por Maria no corredor:
_ Olá gostosona!
Era a chance que ela aguardava. Imediatamente encaminhou a denúncia para o delegado local que propôs uma acareação. No dia e hora combinados, lá estavam Maria e seu Antônio, o escrivão da repartição:
_ Seu Antônio, o senhor tem 30 anos de serviços prestados naquela honrosa repartição, o que houve de fato?
_ Ela é gostosona mesmo senhor delegado!
Sem dar mais nenhuma declaração, seu Antônio se retira. E ao delegado, só resta encaminhar o processo de assédio, mesmo a contragosto.
Meses depois, no Tribunal, tem início a audiência. O juiz pacientemente ouve as partes e observa as provas do delito. Ao retornar do recesso, seu veredicto:
_Senhor Antônio, o Estatuto do Idoso lhe assegura uma pena digna! O senhor está condenado a pagar seu delito com 30 horas de trabalho comunitário... Dispensado!
Furiosa, perplexa e atônita, Maria Regina vê seu Antônio deixar a sala. Impetuosamente, ela parte em direção ao Juiz e dispara a falar sobre a sandice daquela pena. Quando a paciência do Meritíssimo parecia esgotada, ele pronuncia sua última sentença:
_ Cala a boca, Maria!
_ Você é gostosona mesmo!