O Terror Mora na Esquina

O Terror Mora na Esquina

Jorge Linhaça

Eles caminham de dia e de noite, corpos molambos e almas vazias, buscando a felicidade há muito perdida.Mentes sem vontade própria reunidas em ritos tribais e antropofágicos onde devoram e são devorados dioturnamente pela morte que os consome fio a fio.

O demônio,no seu tétrico trono assiste feliz o desfile de seus escravos num grande cordão que aumenta dia a dia qual uma epidemia passada de mão em mão.

Vendeu-lhes a ilusão da felicidade e prometeu que encontrariam quando encontrassem certa pedra que lhes abriria as portas da percepção tal qual um novo fruto da árvore do bem e do mal.

As tribos vagueiam, olhares perdidos, despidos do viço da lucidez.

Tal qual guerreiros ávidos pela tão sonhada glória buscam em vão pela sua recompensa em cada pedra do caminho.

O horror não tem uma única morada, espalha-se por todo lugar ajuntando cada vez mais os modernos zumbis. Já não é preciso o contato com a saliva nem a mordida infectante, basta respirar os vapores das pedras enganadoras que prometem a felicidade.

"Uma pedra hás de encontrar que te fará conhecedor do céu e do inferno.

Uma única pedra entre muitas semelhantes, e aquele que a encontrar, encontrará riqueza, prosperidade e conhecimento sem fim"

Essa foi a promessa feita pelo senhor de todas as trevas.

Os néscios acreditaram, e qual um culto maldito executam seus rituais sem hora marcada.Cada pedra encontrada é deitada ao fogo na esperança de que seja aquela que os libertará. A fumaça inalada corroí corpo e alma, o cérebro rejeita as sinapses dos neurônios e os pobres diabos escravizados não se dão conta de seu fatídico destino.

Não percebem que não são as pedras que são incineradas mas sim suas próprias vidas...já não conseguem voltar aos seus lares pois consomem todo o seu tempo na repetição cada vez mais frequente so satânico ritual.

São sombras que vagueiam na noite com as palmas das mãos queimadas qual um saci,são os filhos sem rosto de uma sociedade à qual rejeitaram ou não suportaram, são espectros semi-humanos a desfilar entre nós.

São a multidão dos cansados, a legião dos sem alma...são os que nos apavoram e que se corroem, são o nosso medo refletido no espelho...

São a sombra de nosso lado obscuro, são a realidade que nos afronta...a lembrança sintetizada de nossas fraquezas e impotência.

São o horror que nos salta aos olhos e que nos assustam mais que vampiros e lobisomens...são o pesadelo materializado que nos aterroriza mais do que Freddy kruger...

Gostaríamos de acordar e não mais os ver...gostaríamos de correr para um local seguro, mas não existe lugar seguro...mais cedo ou mais tarde eles nos alcançam...aparecem nas esquinas...maltrapilhos...fedorentos...carregando seus cachimbos improvisados...carregando a putrefação das almas perdidas.

São o cadáveres dos não mortos...são as lápides que caminham...são os crucificados, os encarcerados nas grades dos demônios, a quem ainda é permitido vagar errantes pelas ruas e vielas.

São as almas penadas que nos rodeiam, são aqueles que nos estendem as mãos ansiosos em busca de uma pedra, aquela única pedra que jamais existiu.

São os escravos sem grilhões de aço, são o fruto da falsa esperança...são aqueles que deixam que suas vidas se vão envoltas na névoa do crack.

O terror mora em cada esquina...

Salvador, 14 de fevereiro de 2012