REENCONTRO
Observava já há uns dez minutos, mais ou menos, tempo de dois cigarros. Estava quieto no meu canto, pessoas passando apressadas e eu ali, parado, como se nada pra fazer. Só fumando e olhando pra ti. De longe, escondido quase que atrás de uma banca de jornal, que era pra tu não me ver. O sinal fechou para os carros e apaguei meu cigarro. Foi aí que tudo aconteceu.
Um sinal fecha, outro abre. Pedestres atravessavam a rua onde eu estava e você continuava lá, na outra esquina. Em que você estava pensando? Seu olhar parecia distante. Minha ansiedade aumentava com o ruído de carros e motos, ônibus e mais ônibus que eventualmente me impediam de te ver. Motores, buzinas, sirenes, vozerio, motores, fumaça, buzinas, freios, vozerio... E a lembrança de sua voz, ao telefone ainda, poucas horas antes. Um dia você me explica como fez aquela voz tão calma. Ali, parado atrás da banca de jornal, você não me parecia calma.
Lembra como tinha movimento na rua? Era dia de semana, todo mundo trabalhando. Você também estava. Tirei você do prédio durante seu almoço, não foi? Enquanto te olhava eu fiquei ensaiando umas desculpas para o atraso. Você nunca gostou de quando eu chegava depois da hora combinada. Será que nunca notou que eu chegava antes? Eu gostava de ficar observando você de longe. Havia esse algo. A pressa de encontrar e o fetiche de observar. Nunca te contei isso.
Apago o segundo cigarro, você acende seu primeiro. Era o sinal, você estava ficando impaciente. Até hoje eu acredito que tenha sido esse o gatilho para tudo. Sua mania de fumar distraída perto do meio-fio, quando ficava irritada por me esperar.
Queria te alcançar sem que me visse de longe. Subi um pouco a rua pra atravessar fora do cruzamento. O celular tocou e eu não quis atender. Era você. Eu estava perto demais e não queria quebrar o suspense. Eu sei que você estava ficando irritada. O tempo passando... O tempo passou rápido. Um ano antes nós estávamos em férias, viajando juntos. Muita coisa aconteceu depois daquilo. Eu errei muito com você. Não conseguia te fazer entender meus sentimentos. Agia pelo inverso do que sentia. Um ano das férias, estávamos nos aproximando novamente. Eu não podia te presentear com uma viagem esse ano, mas levava uma rosa. Era simples, mas era sua. A única rosa roubada por mim deveria ser sua.
O tempo de eu chegar ao cruzamento foi curto e suficiente para ouvir os freios, as buzinas, o som seco do impacto, os gritos, seu grito.
Você dormiu por cinco dias. Foram cinco dias que passei acordado ao seu lado. Esperando você abrir os olhos e sorrir, dizer que não era nada de mais, que logo levantaria e que eu devia descansar. Mas o descanso foi seu. A rosa estava ao lado de sua cama. Era sua rosa. Fiz questão de deixá-la em suas mãos mais tarde, como se aceitasse meu presente.
Essa mesma rosa me levou a entender a razão de você estar inquieta enquanto me esperava. Em seu último evento social, entre seus amigos, nossos amigos, sua família, seus colegas de trabalho, estava também seu noivo. Ele, por você, agradeceu a rosa.
Tenho medo de pedir seu perdão. Eu te perdoaria?