ENGROSSADO DE GALINHA

Naquele dia minha mãe sentiu um forte desejo de comer engrossado de galinha.

Ela foi até o quintal, colheu umas toras de madeira secas e uns gravetos, concertou o fogo do fogão a lenha, e colocou aí um tacho com água para ferver, depois pediu ao meu pai que pegasse uma galinha para o jantar. Ele estranhou, porque não era domingo, porém obedeceu, porque com mulher grávida não se discute.

Era de tardezinha e as galinhas já estavam se aquietando para ir dormir, portanto não foi difícil para meu pai trazer uma delas, rapidinho, para a cozinha. Ele pegou um prato, pôs um pouco de água, pegou uma faca e agachou-se na porta da cozinha, pôs o prato no chão, posicionou a galinha, que resmungava inutilmente, e cortou-a na região entre a cabeça e o pescoço, fez um grande corte, mas não a degolou. Posicionou o jato de sangue na direção do prato. Quando parou de jorrar, ele entregou a defunta, o prato de sangue e a faca para minha mãe. O resto seria com ela.

Minha mãe, com a barriga imensa, caminhava lentamente, porém as mãos continuavam ágeis. Mergulhou a galinha naquele tacho de água fervente, retirou-a e ligeirinho depenou-a. Cortou-lhe as unhas das asas e dos pés, retirou-lhe a casca dos pés. Arrancou fora o tacho, atiçou o fogo que formou uma labareda grande, a qual ela usou para finalizar seu trabalho, passando a galinha nas chamas para queimar a penugem restante. Cortou-a com uma destreza enorme, e em poucos minutos a casa estava impregnada com o cheiro do alho frito na gordura de galinha.

Levaria mais de hora para cozinhar. Nesse tempo, mamãe foi até o quintal colheu salsa e cebolinha. Lavou-as e deixou reservada. Logo ela preparou o arroz.

De vez em quando apareciam curiosos na cozinha, atraídos pelo cheiro da comida e ao certificar-se de que não estava pronta davam meia volta.

Passado uma hora, aproximadamente, mamãe provou o caldo da galinha, despejou na panela o prato de sangue, pôs açafrão, uma pitada de sal, adicionou fubá e mexeu a panela, ininterruptamente, por alguns minutos. Certificou-se de que houvesse pimenta, pois meu pai adorava apimentar seu prato de engrossado. Por fim ela cortou a salsa e a cebolinha e espalhou sobre a panela de galinha. Deu uma mexida em seu conteúdo e o cheiro invadiu a casa inteira. "Que cheiro bom!" pensavam todos...Um a um os filhos foram se aproximando... Que fome! Tá pronto mãe? Perguntavam.

Minha mãe, feliz pelo feito, confirmou e chamou a todos para o jantar. E que jantar! Todos comeram até se fartarem. Satisfeitos, conversaram, riram, o menorzinho queria colo de minha mãe, que já não o tinha tamanha era a pança. Ela sentiu um bater de braços e pernas em suas entranhas. Pousou a mão sobre a barriga. Não, não haverá colo, melhor ir dormir e se acostumar, você já está grandinho, não precisa mais de colo.

Foram todos dormir, de barriga cheia e felizes. O engrossado era sempre um acontecimento naquela casa. Todos adoravam! Comiam que se lambuzavam e em seguida já ficavam sonhando com o próximo, que nesse caso, não demoraria, pois era hábito as mães tomarem-no com frequência durante o resguardo e o resguardo de minha mãe estava batendo à porta.

No dia seguinte, meu pai despertou cedo, como de costume, foi buscar o gado e tirar o leite. Minha mãe demorou-se um pouco para levantar. Quase não conseguia fazê-lo sozinha. Ela não estava se sentindo bem, sentia dores na barriga. Tentou fazer alguma coisa na cozinha, mas não conseguiu. Voltou para o quarto, chamou meu irmão mais velho e pediu-lhe que fosse até o curral chamar o pai. Ele foi correndo. Pouco depois chegou meu pai. Minha mãe deu-lhe a notícia de que era chegada a hora e pediu-lhe para buscar a parteira.

Meu pai encilhou rapidamente o cavalo e em um só galope subiu o morro. Minutos depois voltou com a parteira.

As contrações na barriga de minha mãe já estavam bem fortes. Doía muito e ela estava com medo. Entretanto, ela ficou mais calma depois que vó Rita, a parteira, chegou, confortou-a e organizou tudo para que ocorresse da melhor forma possível. Pouco tempo se passou até que ouviu-se um choro. Era minha irmãzinha que chegava ao mundo. Minha mãe sofria. Parto normal, na roça, sem anestésico algum, mas ela tinha que ser forte, porque ela sabia que ainda não havia terminado, que havia mais uma criança para nascer. Ela respirou fundo, acalmou seu espírito, sentiu nova contração, outra, e outra, dores, contrações, respiração e, aproximadamente, quinze minutos depois eu nasci. Minha mãe respirou aliviada e extremamente feliz por suas duas menininhas que acabavam de chegar.

A vó Rita me limpou, me agasalhou e me colocou sobre a cama e, ali, ao meu lado, senti um respirar, uma batida de coração, uma presença. Senti algo inexplicável! Senti que eu nunca mais estaria sozinha!

DoraSilva
Enviado por DoraSilva em 31/01/2012
Reeditado em 25/02/2012
Código do texto: T3471859
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