Bela chuva prazerosa!

Ela desesperou-se...A avenida Pompéia não tinha mais fim naquela tarde de sábado.Olhou para os lados para não enxergar nada.Nem os meninos ao seu lado.O trabalho era bom.Ganhava o suficiente para manter a casa de 4 cômodos.Comida não faltava,estudos para os filhos também não-Escola Pública.Que chuva ruim nesta hora de decisão.O carro que passa rápido ladeira abaixo não sabe da angústia de uma mãe ,numa tarde de sábado. Nuvens negras que cobrem os céus se assemelham à espuma de sabão da roupa suja que hora antes acabara de lavar. As mãos vermelhas ainda sentiam o ardume do cloro branqueador. Que fazer?...A bolsa pendia nos ombros meio-caídos,quase que aberta,mostrando o terco e os santinhos das preces de todas as noites. Foi tudo em vão?...E o amor?...Valeu a pena deixar o interior pacato,calmo,sem perspectiva,para uma vida agitada e confusa na cidade grande,devoradora de gente? O amor move montanhas e mares. A sensacão de ser o outro,de viver o outro,de sentir o vibrar da juventude nas entranhas e gerar outros seres,valeu a pena?...O olhar dos meninos perguntava sem nenhuma indagacão.Quem tomaria conta deles na hora da labuta?...O homem não foi criado somente para engravidar mulheres,mas...e agora?...Nem disse adeus.Apenas um recado transmitido pela vizinha.Os meninos são bons...apenas observam a reacão da mãe. A impotência é uma desgraca para qualquer ser humano.Uma atitude tem que ser tomada. Doa a quem doer. Na avenida Pompéia há tantos seres humanos,como em qualquer parte do mundo. Alguém haverá de ajudar...A travessia da avenida demorou tanto quanto a criacão de um novo mundo.Dizem que o Criador demorou sete dias.Maria demorou sete extensos minutos.Uma saída mostrou-se quando da passagem de um caminhão de mudancas.A chapa mostrava claro:Presidente Prudente. Lá vai Maria sem saber se o rosto molhado era das lágrimas ou da chuva.A luta pela vida é sempre igual prá todo mundo,depende do valor que se dá para ela.A mãe,Da. Dinata,seria a salvacão! Os meninos,como crianca qualquer,pressentiram a dor da separacão.Ficaram amuados e reclamantes. Partir é pior que morrer.O telefone público resolve até questões de amor e separacão.Ligacão a cobrar.Da. Dinata ,do lado de lá,chorou e concordou. Os meninos não! Mas era preciso. Vida no interior sem pai,mas com os avós é mais fácil.Maria pensou em promessas mil para os meninos...até presentes...nada disso.Apenas olhou e chorou...O choro redime a alma. Foram rápidos pela rua paralela até a casinha de poucos cômodos.A televisão ligada enganava a angústia de todos.Dormir como?!? Pudera...que jantar pesado! As roupas dos meninos,sempre arrumadinhas,foram ajeitadas à forca na única mala existente. A noite toda acordada,Maria sonhou sonhos de amor e das paixões pelo único homem da sua vida. As lágrimas,ela dividiu com os meninos.Os travesseiros foram grandes conselheiros. Domingo tranquilo para viajar.Há mais passagens...e lá se foram deixando pequeno o coracão de Maria...Quinze anos se passaram...Chovia muito no sábado...A avenida Pompéia virou um rio. Me protegi numa loja de plantas naturais lindas.Um rapaz atendente ficou a me observar um bom tempo. Eu estava todo molhado. A maravilhosa Maria eu não conheci,mas escutei a história do garoto. Bela chuva prazerosa!!!

Chico Chicão
Enviado por Chico Chicão em 03/01/2012
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