O passeio de Sara

O PASSEIO DE SARA

Todas as manhãs ela vinha quietinha, olhando o céu acima de sua cabecinha, e os raios de sol que a saudavam. Nos seus nove meses, já conhecia a realidade da vida. Não era como os outros bebês de sua faixa etária. Não conseguia sentar-se, sequer manter a cabeça de pé. Os brinquedos que ganhara de presente, ainda não podia segurá-los, não tinha forças. Não sabia ainda se virar, não mexia as mãos, e com muita dificuldade levantava os bracinhos. Como não sabia falar, chorava, dava verdadeiros guinchos quando estava desesperada, que queria ser trocada, banhada, alimentada. Quantas vezes seus milhões de células nervosas tentaram se reproduzir em vão, sem encontrar o necessário alimento? E as cenas de violência que ela presenciava ainda dentro do ventre.

Era uma menina muito bonita. Moreninha, cabelos encaracolados, sorriso farto animado por dois únicos dentinhos.

Há seis meses fazia a mesma rotina, vinha pela manhã no carrinho, com sua mãe indo para o trabalho, antes parando para deixá-la na creche. Na volta, a mesma rotina.

Fim de ano, a creche encerrou as atividades durante uma semana no intervalo entre o Natal e o fim de ano. A mãe da pequenina, não tinha outra opção, a não ser deixa-la em casa, aos cuidados da avó materna, que era meio louca, drogada e descompensada.

Na segunda manhã que Sara ficou em casa com a avó e os primos, ela foi levada a passeio. Seu pai, um vagabundo drogado, que não se conformava com a separação desde o nascimento da menina, veio visitá-la. Pegou a menina, colocou no carrinho, avisou a avó que ia leva-la para um banho de sol. Era mais ou menos nove horas da manhã. Às quatro da tarde, a mãe de Sara, recebeu uma ligação no seu celular. Estava sendo chamada urgente na Delegacia Policial.

Largou a faxina que fazia no corredor do prédio onde trabalhava, e foi de uniforme mesmo, correndo para ver o que estava acontecendo. Sara, estava no colo de uma policial que tentava de qualquer jeito, calar-lhe o pranto, enquanto a mãe sem saber o que acontecia direito, foi logo mostrando os documentos e tentando compreender o que acontecera. Após os esclarecimentos, saiu com a menina no carrinho, a caminho de casa, notou que a menina se contorcia toda como se estivesse numa crise de nervos. O passeio de Sara foi pelas áreas de viciados no bairro onde eles moravam. Ninguém sabe ao certo como os policiais que faziam a ronda, encontraram a menina dentro do carrinho, próximo a ela, o pai num canto escondido, fumava uma pedra, que conseguira sabe-se lá como. Levados para a delegacia, pai e filha, o pai esclareceu que apenas tinha levado Sara para fazer um passeio. O sol de verão forte queimava a pele da menina, a fome que ela sentia, deixou-lhe meio tonta, mas o movimento da delegacia a fez acordar e berrar de desespero, para desconforto de quem ouvia o seu triste choro.

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 29/12/2011
Código do texto: T3413212
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